… Mas o melhor de tudo é crer em Cristo! Luís Vaz de Camões (c. 1524 — 1580)

sábado, 22 de outubro de 2016

04 -O tribunal de Cristo

C. H. Mackintosh

Breves Meditações
04 - O tribunal de Cristo
Ultimamente temos estado recebendo cartas de vários amigos, nas quais nos podemos advertir, com quanta veemência, buscam luz, no que diz respeito ao solene tema do “Tribunal de Cristo”; e, posto que é muito provável que haja muitos outros que tenham inquietações sobre o mesmo assunto, desejamos determo-nos a considerar com atenção o assunto, não, sem que antes, façamos uma nota abreviada, nas nossas respostas, às cartas dos leitores.


Um querido amigo escreve-nos nestes termos: «Encontro-me, presentemente, numa dificuldade. Acontece que uma amiga muito querida, tem estado muito afligida, pensando que, no Tribunal de Cristo, todo o pensamento secreto e todo o propósito do coração serão manifestados a todos os que lá estiverem presentes. Ela não tem a menor dúvida, nem o menor temor, quanto à sua salvação eterna, ou, quanto ao perdão dos seus pecados; mas, vive com horror ante o pensamento de que os segredos do seu coração haverão de ser manifestados a todos os que estiverem presentes no Tribunal de Cristo.


Outro escreve-nos assim: «Ao recordar as benditas e eternamente importantes verdades de Jo 5:24 ; 1Jo 1:7-9 ; 2:12 ; Hb 10:1-17 , queria saber a maneira como interpreta as passagens que seguidamente lhe cito textualmente, com o propósito de destacar as palavras às quais me refiro particularmente: “Porque todos devemos comparecer ante o Tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o que tiver feito por meio do corpo, ou bem, ou mal. ” “De maneira que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus. ” “Mas quem fizer agravo receberá o agravo que fizer; pois não há acepção de pessoas. ” É meu veemente desejo ter a interpretação e a aplicação correctas destes textos; e creio que ao solicitar-lhe a sua opinião a respeito deste tema não o considerará uma perdida de tempo».


Há já muito tempo que vínhamos tendo grande interesse em examinar as diversas razões acerca da perplexidade que parece generalizar-se com respeito ao solene tema do “Tribunal de Cristo”. As mesmas passagens que cita o nosso correspondente são tão claras, tão pontuais e tão definidas que não podemos senão tomá-las como estão e deixar que caiam com o seu próprio peso no coração e na consciência: “Porque todos devemos comparecer  ante o Tribunal de Cristo , “De maneira que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus ”, “Mas quem fizer agravo receberá o agravo que fizer. ”Estas são afirmações claras. Deveremos debilitar a sua força, diminuir o seu gume, ou embaçar o seu tão zeloso argumento? Que Deus não o permita! Antes pelo contrário, deveremos procurar fazer um santo uso destes textos, deixando que exerçam a sua acção repressora sobre a velha natureza, com todas as suas vaidades, desejos e reacções. O Senhor quis que os utilizássemos desta maneira. Ele nunca teve por objectivo que os utilizássemos de um modo legal, para debilitar a nossa confiança em Cristo e na Sua perfeita salvação. Nunca iremos a juízo pelos nossos pecados; Jo 5:24, Rm 8:1  e 1Jo 4:17  são concludentes a esse respeito. Mas então, os nossos serviços terão que ser expostos aos olhos do nosso Amo. O fogo provará de que classe é a obra de cada homem (assim diz o original grego em 1Co 3:13). O dia declarará –fará manifestas– todas as coisas. Tudo isto é muito solene, e deveria conduzirmos a exercer uma estrita vigilância e a ter sumo cuidado quanto às nossas obras, caminhos, pensamentos, palavras, motivos e desejos. O nosso mais profundo sentido da graça e a mais clara compreensão da nossa perfeita justificação como pecadores jamais debilitarão o nosso sentido da tremenda solenidade do “Tribunal de Cristo”, nem farão minguar o nosso desejo de andar de modo a sermos aceitos nEle, de Lhe sermos agradáveis .


Bom é que discirnamos isto. O Apóstolo trabalhava a fim de que pudesse ser aceito. Ele «tinha sujeito» o seu corpo, não fosse que resulta-se desaprovado . Todo o crente deveria fazer o mesmo. Em Cristo já temos sido feitos aceitáveis e, como tais, trabalhamos para sermos aceites nEle (2Co 5:9). Deveremos procurar dar a cada verdade o seu próprio lugar, e o modo de fazê-lo é estando muito na presença de Deus e ver a cada verdade em imediata relação com Cristo. Existe sempre o perigo de fazermos uso de uma verdade, de tal maneira, que altere outra verdade. Deveremos guardarmo-nos com muito cuidado de cair nesta situação. Nós cremos que no “Tribunal de Cristo” haverá uma plena manifestação de todos e de tudo. Aí cada coisa sairá à luz. Coisas que pareciam muito brilhantes e dignas de louvor, e que fizeram grande pompa entre os homens, aqui em baixo, serão queimadas como tanta “madeira, feno ou palha” (1Co 3:12-15). Coisas que foram demoradamente aclamadas entre os homens e que se utilizaram para colocar os seus nomes num círculo de aplausos humanos, serão submetidas à acção esquadrinhadora do “fogo” e, possivelmente, muitas delas quedarão reduzidas a cinzas. No “Tribunal de Cristo” permanecerão a descoberto as opiniões de todos os corações. Todos os motivos, todos os propósitos e todos os desígnios serão pesados nas balanças do santuário. O fogo provará todas as obras de todos os homens, e nada será afirmado como «genuíno» salvo o que haja sido fruto da graça divina nos nossos corações. Todos os motivos misturados –não puros– serão julgados, condenados e consumidos pelas chamas. Todos os preconceitos, os juízos erróneos, as más suposições que tenhamos feito dos demais, todas estas coisas, e muitas outras mais, similares a estas, ficarão expostas à acção do fogo. Então veremos tudo tal como Cristo o vê, julgaremos todas as cosas tal como Ele as julga. Ninguém se comprazerá mais do que eu mesmo, ao ver toda a minha palha queimando-se. Ainda agora, à medida que crescemos na luz, no conhecimento e em espiritualidade; à medida que nos acercamos e nos assemelhamos mais a Cristo, condenamos de coração muitas coisas que em outro tempo estimávamos por boas ou pelo menos, não más. Quanto mais, pois, o faremos, quando nos acharmos em pleno resplendor da luz do “Tribunal de Cristo”?


Pois bem; qual há-de ser o efeito prático de tudo isto, no crente? Fazê-lo duvidar da sua salvação? Deixá-lo num estado de incerteza a respeito de se é aceite ou não? Fazer com que ponha em pano de fundo a sua relação com Deus, em Cristo? Seguramente que não. Então, qual é? Levá-lo a que ande com santo cuidado no seu dia a dia, consciente de que caminha ante os olhos do Seu Amo e Senhor; que produza nele um espírito de vigilância, de sobriedade e de “juízo próprio”; que infunda nele fidelidade, diligência e integridade, em todos os seus serviços e em todos os seus caminhos.


Vejamos uma simples ilustração. Um pai afasta-se da sua casa por algum tempo, e, quando se despede dos seus filhos, estabelece algumas tarefas para que eles as façam e uma determinada linha de conduta para que a adoptem durante a sua ausência. Pois bem, quando o pai regressar, louvará a alguns dos seus filhos pela sua fidelidade e diligência, enquanto que a outros reprovará pela sua negligência. Pergunto: Acaso considera a estes últimos, como seus filhos? Acaso rompe o vínculo? De nenhuma maneira; eles são tanto seus filhos, como os outros, ainda que assinale fielmente as suas faltas e os censure por elas. Se têm estado mordendo-se e devorando-se uns aos outros, em vez de fazer a vontade do seu pai; se têm estado a julgar a obra uns dos outros, em vez de ocupar com a sua; se houve invejas e ciúmes em vez dum sincero e fervente desejo de levar a cabo as intenções do pai, então, todas estas coisas deverão afrontar uma merecida censura. Como poderia ser de outro modo?


Mas, então alguns, como a amiga do nosso correspondente, «escapam com horror ante o pensamento de que os segredos do coração serão manifestados a todos no Tribunal de Cristo». Bom, o Espírito Santo declara que o Senhor “trará à luz as coisas ocultas das trevas, e manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o louvor. ” Ele não especifica ante quem haverá de manifestar-se; tão pouco isto afecta em absoluto a questão, posto que toda a pessoa sincera estará muitíssimo mais preocupada com o juízo do Senhor do que com o juízo de um conservo, com o que agrade a Cristo, não tem de preocupar-se demasiadamente com o juízo dos homens. Por outro lado, se alguém está muito preocupado pela ideia de ter todos os seus propósitos expostos aos olhos dos homens antes que aos olhos de Cristo, está claro que algo não anda bem. Isto demonstra que se está ocupando consigo mesmo. Se eu me resisto a expor «os meus motivos secretos», então, é claro que eles não são rectos e, quanto antes que eu os julgue, melhor.


E, depois de tudo, em que é que muda o assunto, se os nossos pecados e faltas fossem manifestados a todos? São um ápice menos felizes, Pedro e David, porque incontáveis milhões de almas tenham lido o relato das suas vergonhosas caídas? Seguramente que não. Eles sabem que o registo escrito dos seus pecados só magnifica a graça de Deus e ilustra o valor do sangue de Cristo, e por isso se deleitam n’Ele. Assim ocorre em todos os casos. Se nos despojarmos mais de nós mesmos e nos ocuparmos mais com Cristo, teríamos pensamentos mais simples e correctos, acerca do “Tribunal de Cristo”, assim como de qualquer outro tema de que se trate.


Que o Senhor guarde os nossos corações leais a Si mesmo, durante este tempo da Sua ausência, de modo que quando Ele apareça, não nos envergonhemos diante dEle! Que todos os nossos trabalhos, comecem, prossigam e terminem nEle, para que o pensamento de os termos devidamente sopesados e estimados na presença da Sua glória, não perturbe os nossos corações! Que sejamos constrangidos pelo “amor de Cristo”, e não pelo temor ao juízo, para viver para Aquele que morreu e ressuscitou por nós! (2Co 5:14-15). Podemos deixar-Lhe tudo, com segurança e felicidade, nas Suas mãos, já que Ele mesmo levou os nossos pecados no Seu corpo sobre o madeiro (1Pe 2:24 ). Não temos nenhuma razão para temer, pois sabemos que, quando Ele se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque O veremos tal como Ele é (1Jo 3:2). Assim que Cristo apareça, seremos transformados à Sua imagem, introduzidos na presença da Sua glória e, uma vez aí, revisaremos o passado. Veremos retrospectivamente, desde essa suprema e santa elevação, todos os nossos caminhos aqui em baixo.


Então, veremos as coisas debaixo duma luz totalmente diferente. Pode ser que fiquemos atónitos ao ver que muitas coisas que tanto ocuparam os nossos pensamentos aqui em baixo, serão achadas vãs lá em cima; Entretanto que, por outra parte, muitas coisas pequenas que foram feitas à margem de todo o interesse pessoal e por puro amor a Jesus, ficarão diligentemente registadas e serão recompensadas com acrescimento. Também poderemos ver, na clara luz da presença do Senhor, muitos erros e fracassos que nunca antes tinham sido abarcados pela elevação da nossa visão. E qual será o fruto de tudo isto? Só o de produzir em nossos corações, fortes e extasiados hosanas, para louvor dAquele que nos conduziu até ali, através de todas as armadilhas e perigos, suportando todos os nossos erros e faltas, e que nos atribuiu um lugar no Seu reino eterno, para sermos expostos aos potentes e esplendorosos raios da Sua glória e brilhar à Sua imagem para sempre.


 Não nos explanaremos mais sobre este tema por agora; mas confiamos em que se tenha dito o suficiente para socorrer as mentes daqueles queridos amigos que nos consultaram sobre este assunto. Será sempre para nós, um feliz serviço, mantermos correspondência com os nossos leitores acerca de qualquer questão que possa surgir e que resulte ser uma dificuldade para as suas mentes. Podemos dizer, deveras, que o nosso desejo é que o Senhor faça deste pequeno periódico um meio de ajuda e de bênção para as almas do Seu povo —onde quer que seja que se encontrem— e para que o nome do Senhor Jesus seja engrandecido .


 “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida.” (Jo 5:24, ARC, Pt)


 “Mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado. Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça.” (1Jo 1:7-9, ARC, Pt)


“Filhinhos, escrevo-vos, porque pelo seu nome vos são perdoados os pecados.” (1Jo 2:12, ARC, Pt)


“Porque tendo a lei a sombra dos bens futuros, e não a imagem exacta das coisas, nunca, pelos mesmos sacrifícios que continuamente se oferecem cada ano, pode aperfeiçoar os que a eles se chegam. Doutra maneira, teriam deixado de se oferecer, porque, purificados uma vez os ministrantes, nunca mais teriam consciência de pecado. Nesses sacrifícios, porém, cada ano se faz comemoração dos pecados, Porque é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire os pecados. Por isso, entrando no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste, Mas corpo me preparaste; Holocaustos e oblações pelo pecado não te agradaram. Então disse: Eis aqui venho (No princípio do livro está escrito de mim), Para fazer, ó Deus, a tua vontade. Como acima diz: Sacrifício e oferta, e holocaustos e oblações pelo pecado não quiseste, nem te agradaram (os quais se oferecem segundo a lei). Então disse: Eis aqui venho, para fazer, ó Deus, a tua vontade. Tira o primeiro, para estabelecer o segundo. Na qual vontade temos sido santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo, feita uma vez. E assim todo o sacerdote aparece cada dia, ministrando e oferecendo muitas vezes os mesmos sacrifícios, que nunca podem tirar os pecados; Mas este, havendo oferecido para sempre um único sacrifício pelos pecados, está assentado à destra de Deus, Daqui em diante esperando até que os seus inimigos sejam postos por escabelo de seus pés. Porque com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados. E também o Espírito Santo no-lo testifica, porque depois de haver dito: Esta é a aliança que farei com eles Depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei as minhas leis em seus corações, E as escreverei em seus entendimentos; acrescenta: E jamais me lembrarei de seus pecados e de suas iniquidades. 
Artigo n.º 36 (Vol. I)

http://www.verdadespreciosas.com.ar/index.html



Tradução de Carlos António da Rocha

****

Esta tradução é de livre utilização, desde que a sua ortografia seja respeitada na íntegra porque já está traduzida no Português do Novo Acordo Ortográfico e que não seja nunca publicada nem utilizada para fins comerciais; seja utilizada exclusivamente para uso e desfruto pessoal.

Sem comentários: