… Mas o melhor de tudo é crer em Cristo! Luís Vaz de Camões (c. 1524 — 1580)

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

06 - Um coração para Cristo (Leia Mateus 26)


C. H. Mackintosh

Breves Meditações
06 - Um coração para Cristo (Leia Mateus 26)
Neste solene capítulo temos revelados muitos corações. Temos o coração dos principais dos sacerdotes, o dos anciãos, o dos escribas, o de Pedro e o de Judas. Mas há particularmente um coração diferente de todos os demais: o da mulher que trouxe o vaso de alabastro com o perfume de grande preço para ungir o corpo de Jesus. Esta mulher tinha um coração para Cristo. Ela podia ser uma grande pecadora, uma pecadora muito ignorante; mas os seus olhos haviam sido abertos para ver em Jesus uma beleza que a levou a julgar que nada do que se gastasse com Ele poderia ser demasiado caro. Numa palavra, ela tinha um coração para Cristo.
Passemos, por alto, pelos corações dos principais dos sacerdotes, pelos corações dos anciãos e pelos corações dos escribas e detenhamo-nos uns instantes para considerar o coração desta mulher em contraste com o coração de Judas e o coração de Pedro.
   
1. Judas era um homem ambicioso. Amava o dinheiro, inclinação muito comum em todas as épocas. Havia pregado o Evangelho. Havia caminhado na companhia do Senhor Jesus durante os dias do Seu ministério público. Havia ouvido as Suas palavras, havia visto os Seus caminhos e havia experimentado a Sua bondade; mas, lamentavelmente, ainda que era Apóstolo, ainda que era companheiro de Jesus e pregador do Evangelho, contudo, não tinha um coração para Cristo. Tinha um coração para o dinheiro. O lucro era o motor que animava sempre o seu coração. Quando se tratava de dinheiro, a avidez apossava-se dele. As paixões mais profundas do seu ser eram despertadas pelo dinheiro. “A bolsa” era o seu objecto mais próximo e o mais querido. Satanás sabia-o. Conhecia o particular desejo de Judas. Tinha pleno conhecimento do preço com o qual o poderia comprar. Conhecia o seu homem, sabia como tentá-lo e como utilizá-lo. Solene pensamento!

Mas, advirta-se também, de que a posição de Judas o fazia muito mais apto para os desígnios de Satanás. A sua familiaridade com os caminhos de Cristo fazia-o uma pessoa ideal para O entregar nas mãos dos Seus inimigos. O mero conhecimento intelectual das coisas sagradas, sem que o coração seja tocado, torna o homem mais insensível, profano e perverso. Os principais dos sacerdotes e dos escribas de Mateus 2 tinham um conhecimento intelectual da letra da Escritura, mas não tinham um coração para Cristo. Eles podiam desenrolar o rolo profético sem dificuldade e sem demora e até dar com o lugar donde se achava escrito: “E tu, Belém, terra de Judá, de modo nenhum és a menor entre as capitais de Judá; porque de ti sairá o Guia Que há de apascentar o meu povo de Israel. ” Tudo isto era muito bom, muito certo e muito formoso, mas eles não tiveram, então, um coração para esse “Guia”; não tiveram olhos para vê-Lo; não O quiseram. Sabiam de cor a Escritura. Seguramente ter-se-iam sentido envergonhados se não tivessem podido responder à pergunta de Herodes. Teria sido uma desonra para eles, na posição que ocupavam, dar mostras de ignorância. Mas eles não tinham um coração para Cristo, e por isso puseram os seus conhecimentos bíblicos aos pés de um monarca ímpio, que os iria utilizar, se pudesse, para os seus horrorosos propósitos de assassinar o verdadeiro herdeiro do trono. Para nada serve o conhecimento intelectual das Sagradas Escrituras sem um coração transformado e amoroso.
   
Mas, ninguém pense que nós afirmamos que alguém poderá subestimar o conhecimento das Escrituras. Longe disso. O verdadeiro conhecimento da Palavra deve dirigir o coração a Jesus. Mas, pode suceder que haja um conhecimento da letra da Escritura, até chegar-se a citar um capítulo atrás doutro e um versículo atrás doutro com muito tino; sim, e este conhecimento até pode ver-se acompanhado por um andar aparentemente em harmonia com ele, mas, enquanto isso, ainda com um coração frio e indiferente por Cristo. Este conhecimento só abrirá mais a porta a Satanás, como ocorreu com os principais dos sacerdotes e com os escribas. Herodes não teria solicitado informação a homens ignorantes. O diabo nunca se serve de homens ignorantes ou ineptos para actuar contra a verdade de Deus. Não; ele utiliza os instrumentos mais capazes para levar a cabo a sua obra. Os doutos, os intelectuais, os pensadores mais profundos, sempre que não tenham um coração para Cristo, estarão muito dispostos a servi-lo, em toda a ocasião. Porque não foi assim com os magos “que vieram do oriente”? Porque Herodes —porque Satanás— não pôde recrutar estes sábios, para o seu serviço? Oh, leitor, advirta  a resposta! Eles tinham um coração para Cristo. Bendita salvaguarda! Sem dúvida, eles desconheciam as Escrituras. Não teriam dado mais que umas pobres mostras de destreza na busca duma passagem das Escrituras proféticas; mas buscavam a Jesus; buscavam a Jesus, com veemência, com honestidade e com diligência. Por isso Herodes, se tivesse podido, tê-los-ia utilizado de muito boa vontade; mas não haveriam de ser utilizados por ele. Eles acharam o seu caminho até Jesus. Não sabiam muito acerca do profeta que falava do “Guia”, mas acharam o caminho que os conduzia até ao “Guia”. Acharam-no na Pessoa do Menino que jazia na manjedoura de Belém; e, em lugar de ser instrumentos nas mãos de Herodes, foram adoradores aos pés de Jesus.
   
Pois bem, não se vá supor que elogiamos a ignorância acerca das Escrituras. De maneira nenhuma. Quem não conhece as Escrituras, erra gravemente e sem falta. Para elogio de Timóteo, o Apóstolo pôde-lhe dizer: “E que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação”, mas, aqui neste ponto, agrega: “pela fé que há em Cristo Jesus. ” O verdadeiro conhecimento da Escritura, sempre, nos conduzirá aos pés de Jesus, enquanto que o mero conhecimento intelectual da Bíblia, sem estar acompanhado dum amor de coração por Cristo, só fará de nós instrumentos mais eficazes nas mãos de Satanás. Como foi o caso de Judas, que tinha um coração de pedra, que suspirava por dinheiro. Ele tinha conhecimento, sem um jota de afecto por Cristo, e a sua própria familiaridade com esse Bendito o fez um instrumento apto para o diabo. A sua proximidade com Jesus permitiu-lhe ser um traidor. O diabo sabia que trinta peças de prata podiam pô-lo ao serviço da horrenda tarefa de trair o seu Mestre.
   
Leitor, medite nisto! Aqui temos a um apóstolo, a um pregador do Evangelho, a um professante de peso; mas, debaixo do manto da profissão, jazia um “coração exercitado na avareza ”, um coração que tinha amplo espaço para “trinta peças de prata”, mas sem ter um só cantinho para Jesus. Que figura! Que quadro! Que advertência! Oh, os professantes sem coração para Jesus quanta necessidade têm de olhar para Judas, de considerar a sua linha de conduta, o seu carácter, o seu fim! Judas pregou o Evangelho, mas nunca o conheceu, nunca o creu, nunca o sentiu. Pôde ter pintado os raios do Sol em quadros, mas nunca sentiu a sua influência. Tinha abundância de coração para o dinheiro, mas não um coração para Cristo. Como “filho de perdição”, “enforcou-se”, “para ir-se ao seu próprio lugar” (Jo 17:12 ; Mt 27:5 ; At 1:25). Cristãos professantes, guardem-se do conhecimento intelectual das Sagradas Escrituras, da profissão de lábios, da piedade oficial, da religião mecânica; guardem-se destas coisas e procurem ter um coração para Cristo.
   
2. Em Pedro temos uma outra advertência, ainda que de natureza diferente. Ele amava realmente a Jesus, mas temeu a Cruz. Evitou confessar o Seu nome no meio das filas do inimigo. Jactou-se de que o faria, quando deveria ter-se despojado de si mesmo. Achava-se profundamente adormecido, quando deveria ter estado de joelhos. Em vez de orar, adormeceu. E, mais tarde, em vez de estar tranquilo, vemo-lo brandindo a espada. “Seguiu a Jesus de longe”, e logo o achamos “aquentando-se ao fogo” no pátio do sumo-sacerdote.  Por último, “começou a maldizer e a jurar” que não conhecia a este Mestre de graça. Tudo isto era terrível! Quem imaginaria que o Pedro de Mt 16:16  é o mesmo de Mateus 26? No entanto, é-o. O homem, na sua melhor condição, é como uma murcha folha outonal, “qual sombra que não dura. ” A posição mais eminente, o ministério mais estentóreo , podem terminar seguindo a Jesus “de longe”, e negando vilmente o seu Nome.
   
É muito provável —quase seguro, diria eu— que Pedro teria rechaçado a pontapés o pensamento de vender a Jesus por trinta peças de prata; e, contudo, teve medo de confessá-Lo ante uma criada. Não O teria atraiçoado e entregado aos Seus inimigos, mas negou-O diante deles. Pode não ter amado o dinheiro, mas a sua falta esteve em não manifestar um coração para Cristo.
   
Leitor cristão, recorde a caída de Pedro e guarde-se de confiar em si mesmo. Cultive um espírito de oração. Mantenha-se junto de Jesus. Afaste-se das influências do favor deste mundo. “Conserva-te a ti mesmo puro. ” Guarde-se de cair numa condição de alma preguiçosa e letárgica. Seja vigoroso e vigilante. Ocupe-se com Cristo. Esta é a verdadeira salvaguarda. Não se conforme, meramente, com evitar o pecado manifesto. Não se contente, meramente, com uma conduta e um carácter irrepreensíveis. Fomente afectos vivos e ardentes por Cristo. Alguém que “segue a Jesus de longe” pode negá-lo muito depressa. Pensemos nisto. Tiremos proveito do relato acerca de Pedro. Ele mesmo nos disse mais tarde: “Sede sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar; ao qual resisti firmes na fé. ” Estas são palavras de peso, provenientes, por certo, do Espírito Santo, através da pluma de alguém que tinha sofrido assim por falta de VIGILÂNCIA.
   
Bendita seja a graça que pôde dizer a Pedro, antes da sua caída: “Mas eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça. ” Note-se que o Senhor não disse: «Roguei por ti, para que não caias», mas “que a tua fé não desfaleça” quando tenhas caído. Graça preciosa e sem par! Este era o recurso de Pedro. Era devedor à graça, desde o princípio até ao fim. Como pecador perdido, era devedor “ao sangue precioso de Cristo, ” e, como santo que tropeça, era devedor à prevalecente intercessão de Cristo. Assim ocorreu com Pedro. A advocacia de Cristo constitui a base da sua feliz restauração. Desta advocacia, Judas não sabia nada. Só aqueles que têm sido lavados no sangue participam da intercessão. Judas ignorava tudo isto. Por isso “retirou-se e foi-se enforcar ”; enquanto que Pedro, como homem convertido e restaurado, saiu a ‘confirmar os teus irmãos. ’ Ninguém era más idóneo para fortalecer o confirmar os seus irmãos que alguém que tinha experimentado na sua própria pessoa a restauradora graça de Cristo. Pedro foi capaz de comparecer ante a congregação de Israel e dizer: “Mas vós negastes o Santo e o Justo ”, tal qual ele o tinha feito. Isto faz-nos ver quão inteiramente foi purificada a sua consciência pelo sangue, e o seu coração restaurado pela intercessão de Cristo.
   
3. E agora, restam-me para dizer umas palavras sobre a mulher que veio a Jesus com o vaso de alabastro. Nela se acha um excelente e belo contraste com todos os demais. Enquanto que os principais dos sacerdotes, os escribas e os anciãos se achavam reunidos conspirando contra Cristo “reuniram-se na sala do sumo sacerdote, o qual se chamava Caifás ”, ela achava-se ungindo o corpo de Jesus “E, estando Jesus em Betânia, em casa de Simão, o leproso, aproximou-se dele uma mulher com um vaso de alabastro, com unguento de grande valor, e derramou-lho sobre a cabeça, quando ele estava assentado à mesa. ” Na ocasião em que Judas estava acordando com os principais sacerdotes como vender a Jesus por trinta peças de prata, ela estava derramando o precioso conteúdo do seu frasco de alabastro sobre a Pessoa de Jesus. Patético contraste! Ela estava totalmente absorvida com o seu objectivo, e o seu objectivo era Cristo. Aqueles que não conheciam a Sua excelência e a Sua formosura podiam apelidar de esbanjamento o seu sacrifício. Aqueles que eram capazes de vender a Jesus por trinta peças de prata podiam falar de “dar aos pobres”; mas ela não lhes prestou atenção. Os seus argumentos e murmurações não significaram nada para esta mulher, pois ela tinha encontrado o seu tudo em Cristo. Jesus era mais para ela do que todos os pobres do mundo. Ela sentiu que nada do que se gastasse com Jesus seria “desperdício”. Jesus não podia valer mais do que trinta peças de prata para alguém que tinha o coração para o dinheiro. Para ela, Ele valia mais do que dez mil palavras, por quanto ela tinha o coração para Cristo. Mulher bem aventurada! Oxalá que a imitemos! Oxalá que o nosso lugar seja sempre aos pés de Jesus, amando-O, adorando-O, admirando-O e venerando a Sua bendita Pessoa! Oxalá que consumamos e gastemos todas as nossas energias no Seu serviço, ainda quando os ministros sem coração considerem o nosso serviço como um “desperdício” insensato! Aproxima-se rapidamente o tempo em que não nos arrependeremos de nada do que tenhamos feito por amor ao Seu Nome; se houvesse lugar lá em cima para nos lamentarmos tão somente duma coisa nos lamentaríamos, seria de quão debilmente e com quanta frouxidão servimos a Sua causa no mundo. Se na “manhã sem nuvens” houvesse tão somente um rubor que cobrisse toda a nossa face, dever-se-ia a que nós, quando estivemos aqui em baixo, não nos dedicamos mais integramente ao Seu serviço.
   
Leitor, ponderemos estas coisas. E queira Deus conceder-nos UM CORAÇÃO PARA CRISTO! 

http://www.verdadespreciosas.com.ar/index.html

Tradução de Carlos António da Rocha

****

Esta tradução é de livre utilização, desde que a sua ortografia seja respeitada na íntegra porque já está traduzida no Português do Novo Acordo Ortográfico e que não seja nunca publicada nem utilizada para fins comerciais; seja utilizada exclusivamente para uso e desfruto pessoal.

Sem comentários: