C.
H. Spurgeon
Sermão n.º 15
Sermão n.º 15
“A Bíblia” (The Bible), pregado na manhã
de domingo, 18 de março de 1855, por C. H. Spurgeon, no púlpito da capela de
New Park Street em Exeter Hall, Strand, Londres.
“Escrevi para
eles as grandezas da minha lei; mas isso é para ele como coisa estranha.” (Os 8:12, ARC, Pt)
Esta
é a queixa de Deus contra Efraim. Não é uma prova insignificante da Sua
bondade, que Ele Se incline para repreender as Suas criaturas extraviadas; é
uma grandiosa evidência da Sua disposição cheia de graça, que Ele incline a Sua
cabeça para observar os assuntos da Terra. Se Ele quisesse, poderia envolver-Se
com a noite, como se esta fosse um vestido; poderia colocar as estrelas ao
redor da Sua mão, como se elas fossem uma pulseira e cingir os sóis ao redor da
Sua testa, como se eles fossem um diadema; poderia morar só, longe, muito acima
deste mundo, acima, no sétimo céu, e contemplar, com calma e silenciosa
indiferença, todas as actividades das criaturas humanas. Poderia fazer como
Júpiter que, segundo criam os pagãos, se assentava em perpétuo silêncio,
fazendo cenas, às vezes, com a sua terrível cabeça, para fazer com que as
Parcas fizessem segundo lhe agradasse, porém, ignorando as coisas pequenas da
Terra, e considerando-as indignas de chamar a sua atenção; absorto no seu
próprio ser, absorto em si mesmo, vivendo só e afastado. E eu, como uma das
suas criaturas, poderia subir ao cume duma montanha e olhar para as estrelas
silenciosas e dizer-lhes: “Vós sois os olhos de Deus, porém, não olhais para
mim; a vossa luz é um dom da Sua omnipotência, porém, esses raios não são
sorrisos de amor para mim. Deus, o poderoso Criador, esqueceu-me; sou uma gota
desprezível no oceano da criação, uma folha seca no bosque dos seres viventes,
um átomo na montanha da existência. Ele não me conhece, estou só, só, só.”
Porém, não é assim, amados. O nosso Deus é de uma ordem diferente. Ele observa
a cada um de nós. Não existe, nem mesmo um pardal ou um verme que não se
encontre nos Seus decretos. Não existe uma só pessoa sobre a qual não estejam
pousados os Seus olhos. Os nossos atos mais secretos são por Ele conhecidos.
Qualquer coisa que façamos, que suportemos ou soframos, sempre o olho de Deus
descansa sob nós e o Seu sorriso nos cobre —pois somos Seu povo; ou a Sua ira
nos envolve— pois temo-nos apartado dEle.
Oh!
Deus é dez mil vezes misericordioso, pois que contemplando a raça humana, não a
arranca da existência, com um sorriso. Vemos pelo nosso versículo que Deus Se
interessa pelo Homem, porquanto disse a Efraim: “Escrevi
para eles as grandezas da minha lei; mas isso é para ele como coisa estranha.” Porém, vede, como, quando Ele observa
o pecado do Homem, não o destrói ou o despreza a pontapés, nem tampouco o
sacode pelo pescoço sobre o abismo do Inferno até fazer tremelicar a sua mente
pelo terror, para, finalmente, o lançar nele, para sempre. Pelo contrário, Deus
desce do Céu para argumentar com as Suas criaturas, discute com elas,
rebaixa-Se, por assim dizer, ao mesmo nível do pecador, expõe-lhe as Suas
queixas e alega-Lhe os Seus direitos. Oh! Efraim, escrevi-te as grandezas da Minha
lei, porém elas foram tidas como coisa estranha. Venho esta noite, como enviado
de Deus, meus amigos, para tratar convosco como embaixador de Deus, para vos
acusar de pecado a muitos de vós; para vos fazer ver a vossa condição
espiritual, pelo poder do Espírito; para vos convencer do pecado, da justiça e
do juízo vindouro. O crime do qual vos acuso é o pecado que lemos neste
versículo. Deus escreveu-vos as grandezas da Sua lei, e elas foram tidas como coisa
estranha por vós. É precisamente sobre este bendito livro, a Bíblia, que
pretendo falar no dia de hoje. Aqui está o meu versículo: esta é a Palavra de
Deus. Aqui está o tema do meu sermão, um tema que demanda mais eloquência do
que a que eu possuo; um assunto sobre o qual poderiam falar milhares de
oradores ao mesmo tempo; um tema poderoso, amplo e um assunto inesgotável que,
ainda que consumindo toda a eloquência que houvesse até à eternidade, não
permaneceria esgotado.
Esta
noite tenho três coisas para vos dizer acerca da Bíblia, e as três (coisas) se
encontram no meu versículo. Primeiro, o Seu autor: “[Eu] escrevi”; segundo, os
seus temas —as grandezas da Lei de Deus; e terceiro, o seu tratamento
generalizado —foram tidas pela maioria dos homens como coisa estranha.
I.
Primeiro, então, com relação a este livro, quem é o autor? O texto diz-nos que
é Deus. “Escrevi para eles as grandezas da minha lei.” Aqui está a minha Bíblia, quem a
escreveu? Abro-a e observo que se compõe de uma série de tratados. Os seus
primeiros cinco livros foram escritos por um homem chamado Moisés. Passo as
páginas, e vejo que há outros escritores tais como David e Salomão. Aqui leio a
Miquéas, a seguir a Amós, depois a Oséas. Prossigo para diante e chego às
luminosas páginas do Novo Testamento, e vejo Mateus, Marcos, Lucas e João;
Paulo, Pedro, Tiago e outros; porém, quando fecho o livro, pergunto-me: quem é
o seu autor? Podem estes homens, em conjunto, atribuir-se a paternidade deste
livro? São eles realmente os autores deste extenso volume? Divide-se entre
todos eles, essa honra? A nossa santa religião responde: Não! Este volume é a
escrita do Deus vivo; cada letra foi escrita por um dedo Todo-Poderoso; cada
palavra saiu dos lábios eternos, cada frase foi ditada pelo Espírito Santo.
Ainda que Moisés tenha sido usado para escrever as suas histórias com a sua
ardente pluma, Deus guiou essa pluma. Pode ser que David tenha tocado a sua
harpa, fazendo que doces e melodiosos salmos brotassem dos seus dedos, porém
Deus movia as Suas mãos sobre as cordas vivas da sua harpa de ouro. Pode ser
que Salomão tenha cantado os Cânticos de Amor, ou que tenha pronunciado
palavras de sabedoria consumada, porém Deus dirigiu os seus lábios, e fez
eloquente o Pregador. Se sigo ao trovejador Naúm, quando os seus cavalos sulcam
as águas, ou a Habacuc quando ele vê as tendas de Cusan em aflição; se leio
Malaquias, quando a terra está ardendo como um forno; se passo para as plácidas
páginas de João, que nos falam de Amor, ou para os severos e fogosos capítulos
de Pedro, que falam do fogo que devora os inimigos de Deus, ou para Judas, que
lança anátemas contra os adversários de Deus; em todas as partes vejo que é
Deus quem fala. É a voz de Deus, não do homem; as palavras são as palavras de
Deus, as palavras do Eterno, do Invisível, do Todo-Poderoso, do Jeová desta
Terra. Esta Bíblia é a Bíblia de Deus; e quando a vejo, parece-me ouvir uma voz
que surge dela, dizendo: “Sou o livro de Deus; homem, lê-me. Sou a Escritura de
Deus: abre as minhas folhas, porque foram escritas por Deus; lê-as, porque Ele
é o meu autor, e poderás vê-Lo visível e manifesto em todas as partes.” “[Eu] para eles as grandezas da minha lei; mas isso é para ele como
coisa estranha.”
Como
sabemos que Deus escreveu este livro? Não tentarei responder a esta pergunta.
Poderia fazê-lo, se quisesse, porque há razões e argumentos suficientes para
isso, porém eu não penso em roubar-vos o vosso tempo nesta noite, expondo esses
argumentos à vossa consideração; sim, não farei isso. Se quisesse, poderia
dizer-vos que a grandeza do seu estilo está acima de qualquer escrita mortal, e
que todos os poetas que já existiram no mundo, com todas as suas obras juntas,
não poderiam oferecer-nos uma poesia tão sublime, nem uma linguagem tão
poderosa como aquela que podemos encontrar nas Escrituras. Poderia insistir de
que os temas tratados na Bíblia estão muito acima do intelecto humano; de que o
Homem nunca poderia ter inventado as grandes doutrinas da Trindade na Deidade;
de que o Homem nunca nos poderia ter dito nada acerca da criação do Universo;
nenhum ser humano teria podido ser o autor da sublime ideia da Providência; de
que todas as coisas são ordenadas segundo a vontade de um grandioso Ser
Supremo, e que todas elas obram juntamente para o bem. Poderia falar-vos acerca
da sua honestidade, pois relata as falhas dos seus escritores; da sua unidade,
pois nunca se contradiz; da sua simplicidade magistral, para que o mais simples
a possa ler. E poderia mencionar centenas de coisas mais, que poderiam
demonstrar, com claridade, que o livro é de Deus. Mas, não vim aqui para provar
isso. Sou um ministro cristão, e vós sois cristãos, ou professais sê-lo; e
nenhum ministro cristão precisa trazer à baila os argumentos dos pagãos para os
rebater. É a maior insensatez do mundo. Os infiéis, pobres criaturas, não
conhecem os seus próprios argumentos até que nós lhos ensinemos, e eles,
juntando-os pouco a pouco, voltam a lançá-los, como lanças sem pontas, contra o
escudo da verdade. É uma insensatez tirar estes tições do fogo do Inferno,
ainda que estejamos bem preparados para apagá-los. Deixemos que os homens do
mundo aprendam o erro por si mesmos; não sejamos propagadores das suas
falsidades. É certo que há pregadores, que não contando com suficientes
argumentos, os tiram de qualquer parte; porém, os homens eleitos do próprio
Deus não necessitam de fazer isso; eles são ensinados por Deus, e Deus
subministra-lhes os temas, as palavras e o poder. Talvez haja alguém, aqui
nesta noite, que tenha vindo sem fé, um homem racionalista, um livre-pensador.
Com esse homem não vou discutir. Confesso que não estou aqui para participar em
controvérsias, mas para pregar o que conheço e sinto. Mas, também, eu já fui
como esse homem. Houve uma hora má na minha vida, quando soltei a âncora da minha
fé; cortei o cabo das minhas crenças, e, não querendo já estar por mais tempo
ao abrigo das costas da revelação, deixei que o meu navio andasse à deriva,
impulsionado pelo vento. Disse à razão: “Sê tu o meu capitão”; disse ao meu
cérebro: “Sê tu o meu timão.” E, assim comecei a minha louca viagem. Graças a
Deus que tudo isso já terminou. Porém, contar-vos-ei a minha breve história.
Foi uma navegação precipitada pelo oceano tempestuoso do livre pensamento.
Conforme avançava, os céus começaram a obscurecer-se; porém, para compensar
essa deficiência, as águas eram brilhantes, com fulgores esplendorosos. Eu via
que subiam centelhas que me agradavam, e pensei: “Se isto é o livre pensamento,
é algo maravilhoso.” Os meus pensamentos pareciam gemas e eu espalhava estrelas
com as minhas duas mãos; porém, imediatamente, no lugar daqueles fulgores de
glória, vi amigos amargos, ferozes e terríveis, surgindo das águas, e, conforme
prosseguia, eles rangiam os seus dentes fazendo gestos trocistas; aferraram-se
à proa do meu navio e arrastaram-me. Enquanto eu, em parte, me sentia feliz com
a velocidade a que ia, estremecia-me, contudo, pela rapidez terrificante com
que deixava para trás os velhos pilares da minha fé. Conforme seguia, avançando
a uma velocidade horripilante, comecei a duvidar até da minha própria
existência; duvidava que o mundo existisse; duvidava que houvesse tal coisa
como o meu próprio eu. Cheguei à borda dos domínios sombrios da incredulidade.
Fui até ao próprio fundo do mar da infidelidade. Duvidava de tudo. Mas, aqui,
Satanás enganou-se a si mesmo, porque a própria extravagância das dúvidas me
demonstrou o absurdo delas. Justamente quando vi o fundo desse mar, escutei uma
voz que me dizia: “E pode esta dúvida ser verdade?” Por causa deste pensamento
voltei à realidade. Despertei-me desse sono de morte, que, Deus o sabe, poderia
ter condenado a minha alma e destruído o meu corpo, se não me tivesse
despertado. Quando me levantei, a fé tomou o timão; a partir desse momento, já
não duvidei. A fé conduziu a minha barca de volta; a fé gritava: “Longe daqui,
longe daqui!” Lancei a minha âncora no Calvário; alcei os meus olhos a Deus, e
eis-me aqui vivo e fora do Inferno. Portanto, eu digo o que sei. Naveguei nessa
viagem perigosa; regressei ao porto são e salvo. Peçam-me que seja outra vez um
incrédulo! Não, já o provei. Foi doce ao princípio, mas amargo, depois. Agora,
atado ao Evangelho de Deus, mais firmemente do que nunca, firme sobre uma
rocha, mais dura do que o diamante, desafio os argumentos do Inferno a que me
movam, “Porque eu sei em quem tenho crido, e estou
certo de que é poderoso para guardar o meu depósito, até àquele dia.” (2Tm 1:12, ARC, Pt) Porém, não vou
refutar, nem argumentar nesta noite. Vós professais ser homens cristãos, pois
do contrário não estaríeis aqui. Ainda que a vossa profissão possa ser falsa; o
que vós dizeis ser, pode ser exatamente o contrário do que realmente sois.
Porém, ainda assim, eu suponho que todos vós admitis que esta é a Palavra de
Deus. Vou partilhar um par de pensamentos sobre isto. “[Eu] escrevi para eles as grandezas da minha lei.”
Primeiro,
meus amigos, examinai este volume e admirai a sua autoridade. Este não é um
livro comum. Não contém os ditos dos sábios da Grécia, nem os discursos dos
filósofos da antiguidade. Se estas palavras tivessem sido escritas pelo homem,
poderíamos rejeitá-las; mas, oh! Deixai-me meditar num solene pensamento —que
este livro é a letra de Deus, que estas são as Suas palavras! Deixai-me
investigar a sua antiguidade: está datado das colinas do Céu. Permiti-me que
olhe para as suas letras: lançam clarões de glória aos meus olhos. Deixai-me
ler os seus capítulos: o seu significado é grandioso e contêm mistérios
escondidos. Voltemo-nos para as profecias: estão cheias de inefáveis maravilhas.
Oh, livro dos livros! E foste tu escrito pelo meu Deus? Então, prostro-me
diante de ti. Tu, livro de vasta autoridade; tu és uma proclamação do Imperador
do Céu. Longe esteja de mim exercitar a minha razão para contradizer-te.
Razão!, a tua função é considerar e averiguar o que este volume quer dizer, e
não estabelecer o que deveria dizer. Vamos, vós, a minha razão e o meu intelecto,
sentai-vos e escutai, porque estas palavras são as palavras de Deus. Sinto-me
incapaz de me estender neste pensamento. Oh, se vós pudésseis recordar sempre
que esta Bíblia foi verdadeira e realmente escrita por Deus! Oh! Se vos fosse
permitido entrar nas câmaras secretas do Céu, e tivésseis podido contemplar a
Deus quando tomava a Sua pluma e escrevia estas letras, então, com certeza, as
respeitaríeis. Mas, são efetivamente o manuscrito de Deus, tanto como se vós
tivésseis visto Deus escrevê-las. Esta Bíblia é um livro de autoridade, é um
livro autorizado, pois Deus escreveu-o. Oh, tremei, tremei, não haja ninguém
que o despreze; observai a sua autoridade, porque é a Palavra de Deus.
Então,
posto que Deus a escreveu, notemos a sua veracidade. Se eu a tivesse escrito,
haveria vermes críticos que de imediato a atropelariam, e a cobririam com as
suas larvas malvadas. Se eu a tivesse escrito, não faltariam homens que a
despedaçariam imediatamente, e talvez, com muita razão. Porém, esta é a Palavra
de Deus. Aproximai-vos, vós, críticos, e encontrai-lhe alguma falha; examinai-a
desde o seu Génesis até ao seu Apocalipse, e encontrai-lhe um erro. Esta é uma
veia de puro ouro, sem mescla de quartzo, ou de qualquer outra substância
terrena. Esta é uma estrela sem mancha, um sol de perfeição, uma luz sem
sombra, uma lua sem a sua palidez, uma glória sem penumbra. Oh, a Bíblia! Não
se pode dizer de qualquer outro livro que seja perfeito e puro; porém, nós
podemos declarar de ti que toda a sabedoria se encontra encerrada em ti, e que
em ti não há nenhuma partícula de insensatez. Este é o juiz que põe fim a toda
a discussão, ali, onde a inteligência e a razão fracassam. Este livro não tem
mancha de erro; porém, é puro, sem mescla, a verdade perfeita. Por quê? Porque
Deus o escreveu. Ah! Acusai Deus de erro, se quiserdes; dizei-Lhe que o Seu
livro não é o que deveria ser. Tenho ouvido homens cheios de orgulho e de falsa
modéstia, que gostariam de alterar a Bíblia, e (quase me ruborizo ao dizê-lo)
tenho ouvido a alguns ministros que alteraram a Bíblia de Deus, porque tinham
medo dela. Nunca ouvistes um homem dizer: “Quem crer
e for batizado será salvo: mas quem não crer?” (Mc 16:16, ARC, Pt) —o que é que a Bíblia diz?— “Será
condenado.” Porém, acontece que isto é algo rude, portanto eles dizem: “Será
desaprovado.” Cavalheiros! Eliminai o veludo das vossas bocas, e pregai a
Palavra de Deus; não necessitamos de nenhuma das vossas alterações. Tenho
escutado algumas pessoas que, orando, ao invés de dizerem: “Fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição” (2Pe 1:10, ARC, Pt), dizem: “Fazer cada vez mais firme a vossa vocação e salvação.”
É
uma lástima que não tenhais nascido quando Deus morava nos tempos remotos, há
muito, muito tempo, para que tivésseis podido ensinar a Deus como escrever. Oh!
Desonestidade além de todo o limite! Oh! Orgulho desmedido! Procurar ditar ao
Sábio dos sábios, de ensinar ao Omnisciente e de instruir ao Eterno! É estranho
que haja homens tão vis que usem o canivete de escriba de Jeioaquim para
mutilar passagens da Palavra, porque têm mau sabor. Oh, vós que sentis aversão
por certas porções da Santa Escritura, tende a certeza de que o vosso gosto é
corrompido e que a vontade de Deus não se sujeita à vossa pobre opinião. A tua
desaprovação é precisamente a razão pela qual Deus a escreveu; porque não se
deve acomodar a ti, nem tens direito a ser comprazido. Deus escreveu o que a ti
não te agrada: escreveu a verdade. Oh, prostremo-nos em reverência diante dela,
pois Deus a inspirou. É a verdade pura. Desta fonte manda aqua vitae —a água da
vida— sem nenhuma partícula de terra; deste sol nascem raios de esplendor sem
sombra alguma. Bendita Bíblia; tu és toda a verdade.
Antes
de deixar este ponto, detenhamo-nos a considerar a natureza misericordiosa de
Deus, em ter-nos escrito uma Bíblia. Ah! Ele poderia ter-nos deixado sem ela,
que tatearíamos no nosso caminho de trevas, como os cegos apalpam buscando a
parede; poderia ter-nos deixado no nosso extravio, com a estrela da razão como
nosso único guia. Recordo uma história do Senhor Hume, o qual constantemente
afirmava que a luz da razão é suficiente em abundância. Estando na casa de um
bom ministro de Deus, numa noite, havia estado discutindo sobre este assunto,
manifestando a sua firme convicção na suficiência da luz da natureza. Ao sair,
o ministro ofereceu-lhe uma vela, para o iluminar, enquanto ele descia as
escadas. Ele disse: “Não, a luz da natureza será suficiente; o luar me
bastará.” Porém, ocorreu que uma nuvem estava ocultando a Lua, e ele caiu,
escadas abaixo. “Ah!”, disse o ministro, “Apesar de tudo, teria sido melhor ter
tido uma luzita daqui de cima, senhor Hume.” Então, ainda que supondo que a luz
natural fosse suficiente, seria melhor que tivéssemos tido uma pequenina luz de
aqui de cima, e dessa maneira estaríamos seguros de estarmos certos. É melhor
ter duas luzes do que uma. A luz da criação é muito brilhante. Podemos ver a
Deus nas estrelas; o Seu nome está escrito com letras de ouro no rosto da
noite; podemos descobrir a Sua glória nas ondas do oceano, sim, e nas árvores
do campo. Mas, é melhor ler em dois livros, do que em um. Encontrá-Lo-eis aqui
mais claramente revelado, porque Ele mesmo escreveu este livro e nos deu a
chave para entendê-lo, se vós tiverdes o Espírito Santo. Amados irmãos, demos
graças a Deus por esta Bíblia. Amemo-la e consideremo-la mais preciosa do que o
ouro mais fino.
Uma
observação mais, antes de passar ao segundo ponto. Se esta é a Palavra de Deus,
que será de alguns de vós que não a tendes lido durante todo o último mês? “Um
mês, diz você? Eu não a li durante todo este último ano!” Ai, e muitos de vós
não a haveis lido nunca. A maioria das pessoas trata a Bíblia mui cortesmente.
Têm uma edição de bolso belamente encadernada, envolvem-na num pano branco, e
assim a levam ao lugar do culto. Quando regressam a casa, guardam-na numa
gaveta até ao próximo domingo, pela manhã. Então, lá a voltam a tirar para um
passeio, e a levam à capela; tudo quanto a pobre Bíblia recebe é este passeio
dominical. Esse é o vosso estilo de tratar este mensageiro celestial. Há pó
suficiente sobre algumas das vossas Bíblias para escrever “condenação” com os
vossos próprios dedos. Muitos de vós nem sequer a tendes folheado há muito,
muito, muito tempo, e, que pensais? Digo-vos duras palavras, porém, palavras
verdadeiras. Que dirá Deus, finalmente? Quando fordes à Sua presença, Ele
perguntará: “Leste a minha Bíblia?” “Não.” “Escrevi-te uma carta de
misericórdia, leste-a?” “Não.” “Rebelde! Enviei-te uma carta, convidando-te a
vir a Mim, leste-a alguma vez?” “Senhor, nunca rompi o selo: guardo-a
constantemente bem fechada.” “Maldito”, diz Deus, “Então, tu mereces o Inferno;
se te enviei uma epístola de amor, e nem sequer quiseste romper o selo, que
farei contigo?” Oh! Não permiti que isso vos suceda. Sede leitores da Bíblia,
sede esquadrinhadores da Bíblia.
II.
O nosso segundo ponto é: os temas dos quais a Bíblia trata. As palavras do
versículo são estas: “[Eu] para eles as grandezas da
minha lei.” A Bíblia fala de
grandes coisas e somente de grandes coisas. Não há nada na Bíblia que não seja
importante. Cada versículo contém um solene significado, e, se todavia não o
temos encontrado, esperamos vir a encontrá-lo. Vós tendes visto múmias,
cobertas com tiras de pano de linho. Bem, a Bíblia de Deus, é algo parecido; há
numerosos rolos de linho branco, tecidos no tear da verdade; de maneira que
tereis de continuar desatando, rolo após rolo, até encontrardes o verdadeiro
significado do que está escondido; e, quando crerdes, havê-lo encontrado, ainda
continuareis decifrando as palavras deste maravilhoso volume durante toda a
eternidade. Não há nada na Bíblia que não seja grandioso. Permiti-me dividir,
para ser mais breve. Primeiro, todas as coisas nesta Bíblia são grandiosas;
segundo, algumas dessas coisas são mais grandiosas do que outras.
Todas
as coisas na Bíblia são grandiosas. Algumas pessoas pensam que não importa a
doutrina na qual se crê; que é algo secundário a que igreja você assiste; que
todas as denominações são iguais. Há um ser, a senhora Intolerância, a qual eu
detesto mais do que a ninguém no mundo, e à qual jamais fiz algum cumprimento
ou elogio; mas há outra pessoa, à qual odeio igualmente; trata-se do senhor
Latitudinarismo[1],
—indivíduo bem conhecido que descobriu que todos somos iguais. Agora, eu creio
que uma pessoa pode ser salva em qualquer igreja. Algumas têm sido salvas na
igreja de Roma, uns poucos homens benditos cujos nomes poderia citar aqui.
Também sei, bendito seja Deus, que grandes multidões são salvas na Igreja da
Inglaterra; nela há uma hoste de sinceros e piedosos homens de oração. Creio
que todos os ramos do protestantismo cristão têm um remanescente segundo a
eleição da graça; e que necessitam ter, algumas delas, um pouco de sal, pois do
contrário se corromperiam. Mas, quando digo isso, vós imaginais que coloco
todas elas no mesmo nível? Estão todas, igualmente certas? Uma diz que o batismo
de infantes é correto, outras afirmam que não é correto. Alguns dizem que ambas
têm razão, mas eu não o vejo assim. Uma ensina que somos salvos pela graça
soberana, outra diz que não, senão que é o nosso livre-arbítrio que nos salva;
contudo, outras dizem que as duas coisas estão certas. Eu não entendo assim.
Uma diz que Deus ama o Seu povo e que nunca deixará de amá-lo; outra afirma que
Ele não amou o Seu povo antes que o Seu povo O amasse; que umas vezes o ama e
outras vezes deixa de amá-lo, virando-lhe as costas. Ambas podem ter razão no
essencial, porém, nunca quando uma diz “Sim” e outra diz “Não.” Para ver assim
necessitaria de um par de lentes, que me ajudassem a olhar para trás e para a
frente, ao mesmo tempo. Não pode ser, senhores, que ambas tenham razão, apesar
de que há quem diga que as diferenças não são essenciais. Este texto diz: “[Eu]
escrevi para eles as grandezas da minha lei.” Não há nada na Bíblia de Deus que não
seja grandioso. Já alguma vez parastes para ver qual é a religião mais pura?
“Oh”, dizeis, “nunca nos molestamos com isso. Nós, simplesmente, vamos aonde o
nosso pai e a nossa mãe foram.” Ah! Essa é certamente uma razão muito profunda.
Vós ides aonde vossos pais foram. Eu cria que vós éreis gente sensata, e nunca
pensei que vos deixásseis levar pelos outros, em vez de ser pela vossa própria
convicção. Eu amo os meus pais, acima de tudo o que respira, e o simples facto
de que eles creram que uma coisa é verdade, ajuda-me a pensar que o é; porém,
eu não os segui. Pertenço a uma denominação diferente, e dou graças a Deus por
isso. Posso recebê-los como irmãos e irmãs em Cristo, mas nunca pensei que,
porque eles foram uma coisa, eu tinha de ser o mesmo. Nada disso. Deus deu-me
um cérebro e devo utilizá-lo; e se vós tendes algum intelecto, deveis usá-lo,
também. Nunca digais que não importa. Claro que importa. Tudo quanto Deus
escreveu aqui é de importância eminente; Ele jamais teria escrito uma coisa que
fosse indiferente. Tudo quanto está escrito aqui tem valor; portanto,
esquadrinhai todos os temas, provai tudo pela Palavra de Deus. Não tenho
nenhuma objeção a que tudo o que eu pregue seja provado por este livro. Dai-me
somente um auditório imparcial e nenhum favor especial, e este livro; e se digo
algo contrário a ele, retratar-me-ei no domingo seguinte. Por isto me mantenho
firme ou caio. Buscai e olhai, porém nunca digais: “Não importa.” Quando Deus
diz algo, isso deve ser sempre importante.
Mas,
ainda que todas as coisas na Palavra de Deus sejam importantes, nem tudo é
igualmente importante. Há certas verdades vitais e fundamentais que devem ser
cridas, ou pelo contrário, o homem não poderia ser salvo. Se quereis saber o
que é que deveis crer para serdes salvos, encontrareis as grandezas da lei de
Deus entre estas duas capas; todas estão contidas aqui. Como compêndio ou
resumo das grandezas da lei, recordo o que um velho amigo meu disse certa vez:
“Ah! Prega os três ‘erres’ e Deus abençoar-te-á sempre.” Eu perguntei: “O que
são esses três ‘erres’?” E ele respondeu-me: “Ruína, Redenção e Regeneração.”
Estas três coisas contêm a essência e a substância da teologia. “R” de Ruína.
Todos fomos arruinados na queda, todos nos perdemos quando Adão pecou e todos
estamos arruinados pelas nossas próprias transgressões; todos estamos
arruinados pelos nossos corações perversos, pelos nossos maus desejos, e todos
estaremos arruinados, a menos que a graça nos salve. Então, vêm o segundo “R”,
de Redenção. Somos redimidos pelo sangue de Cristo, um Cordeiro sem mancha, nem
contaminação: somos resgatados pelo Seu poder, somos redimidos pelos Seus
méritos; e somos —resgatados pela Sua força. Continuando, temos o “R” de
Regeneração. Se quisermos ser perdoados, temos também de ser regenerados,
porque ninguém pode ser partipante da redenção sem ser regenerado. Podemos ser
tão bons como queiramos, e servir a Deus segundo o imaginemos, segundo
queiramos; porém, se não tivermos sido regenerados, se não tivermos um coração
novo, se não nascermos de novo, ainda estamos no primeiro “R”, isto é, na
Ruína. Este é um pequeno resumo do Evangelho, porém creio que há um outro
melhor nos cinco pontos do Calvinismo; eleição segundo a presciência de Deus, a
depravação natural e a pecaminosidade do homem, a redenção particular pelo
sangue de Cristo, a chamada eficaz pelo poder do Espírito e a perseverança
final pelo poder de Deus. Para sermos salvos, devemos crer nestes cinco pontos;
porém não gostaria de escrever um credo como o de Atanásio, que começa assim:
“Todo aquele que quiser ser salvo, deverá crer em primeiro lugar na fé católica,
a qual é esta”; ao chegar a este ponto, teria de me deter porque não saberia
como continuar. Sustento a fé católica da Bíblia, de toda a Bíblia e nada mais
que a Bíblia. Não me diz respeito elaborar credos; senão que vos suplico que
esquadrinheis as Escrituras, porque elas são a Palavra de Vida.
Deus
diz: “[Eu] escrevi para eles as grandezas da minha
lei.” Duvidais da Sua
grandeza? Credes que não são dignas da vossa atenção? Pensa um momento, Homem,
onde te encontras agora?
“Eis
aqui, um estreito pedaço de terra,
Na
metade dos mares sem limites;
Uma
polegada de tempo, o espaço de um momento,
Posso
alojar-me naquele lugar celestial
Ou
encerrar-me no Inferno.”
Recordo-me
que uma vez estava na praia, numa estreita faixa de terra, sem me preocupar que
a maré pudesse subir. As ondas lavavam constantemente ambas as margens, e
envolto nos meus pensamentos, permaneci ali por muito tempo. Quando quis
regressar, encontrei-me ante uma dificuldade: as ondas tinham cortado o
caminho. Da mesma maneira, todos nós caminhamos cada dia por uma estreita
senda, e há uma onda que sobe cada vez mais; vede, como está perto dos vossos
pés; e, vede! Outra se aproxima a cada tic-tac do relógio: “Os nossos corações,
como surdos tambores, estão redobrando marchas fúnebres a caminho da
sepultura.” Cada momento que vivemos é um avanço para a sepultura. Porém, este
Livro diz-me que, se sou convertido, quando morrer, receber-me-á um céu de gozo
e amor; os anjos esperar-me-ão com os seus braços abertos, e eu, levado pelas
potentes asas dos querubins, ultrapassarei o relâmpago e elevar-me-ei para além
das estrelas, ao trono de Deus, para morar lá, para sempre.
“Longe
de um mundo de pecado e de dor,
Morarei
lá, sempre, com Deus.”
Oh!
Isto faz com que os meus olhos derramem lágrimas mornas, isto faz com que o meu
coração se torne muito grande para o meu peito, e o meu cérebro gire só perante
o pensamento de:
“Jerusalém,
meu lar feliz,
Teu
nome é sempre doce para mim.”
Oh! Essa doce cena além das nuvens; doces campos
revestidos de verde vivo e de rios de delícia. Não são estas coisas,
grandiosas? Porém, então, pobre alma não regenerada, a Bíblia diz que, se tu
estás perdido, tu estás perdido para sempre; diz-te que se morreres sem Cristo,
sem Deus, não há esperança para ti; que há um lugar sem nenhum raio de
esperança, onde lerás com letras gravadas a fogo: “Conhecias o teu dever, mas
não o cumpriste”; diz-te que serás lançado da Sua presença com um: “Apartai-vos
de mim, malditos” (Mt 25:41, ARC, Pt). Acaso não é grandioso, tudo isto? Sim,
senhores, assim como o Céu é desejável, assim como o Inferno é terrível, assim
como o tempo é breve, assim como a eternidade é infinita, assim como a alma é
preciosa, assim como a dor deve ser evitada, assim como o céu deve ser buscado;
assim, também, Deus é eterno, e, como as Suas palavras são certas, estas coisas
são grandiosas; são as coisas que vós deveis escutar.
III.
O nosso último ponto é: o tratamento que a pobre Bíblia recebe neste mundo. A
Bíblia é considerada como uma coisa estranha. O que significa a Bíblia ser
considerada como uma coisa estranha? Em primeiro lugar, quer dizer que é
completamente alheia a muitas pessoas, porque nunca a lêem. Recordo que, em
certa ocasião, eu estava lendo a sagrada história de David e Golias, e estava
presente uma pessoa, de idade avançada, que me disse: “Meu Deus! Que história
interessante; em que livro está?” Também me vem à memória outra pessoa que,
falando comigo, em privado, eu falei-lhe acerca da sua alma, e ela disse-me
quão profundo era o seu sentimento, já que tinha enormes desejos de servir ao
Senhor, porém encontrava outra lei nos seus membros. Eu abri a Bíblia em
Romanos e li-lhe: “Porque não faço o bem que quero,
mas, o mal que não quero, esse faço.”
(Rm 7:19, ARC, Pt) “Isto está na Bíblia?”, perguntou ela, “Eu não sabia disso.”
Não a culpei pela sua falta de interesse na Bíblia, até então; mas parecia-me
difícil encontrar pessoas que não soubessem absolutamente nada sobre tal
passagem. Ah! Vós sabeis mais acerca dos livros de contabilidade dos vossos negócios
do que sobre a Bíblia; sabeis mais acerca dos diários das vossas vidas do que
sobre o que Deus escreveu. Muitos de vós podeis ler um romance do princípio ao
fim, e que proveito tirais disso? Um bocado de pura espuma ao haverdes
terminado a sua leitura. Mas não podeis ler a Bíblia; este manjar sólido,
perdurável, substancioso e que satisfaz, permanece sem ser provado, guardado no
armário da negligência; enquanto que tudo quando o homem escreve, é recebido
diariamente, e devorado com avidez. “[Eu] escrevi-lhe as grandezas da minha
lei, porém essas são estimadas como coisa estranha.” (Oséas 8:12) Vós nunca a
haveis lido. Tenho essa dura acusação contra vós. Talvez vós respondais que não
deva culpar-vos por uma coisa assim. Porém, penso sempre que mais vale ter uma
opinião pior de vós, do que uma demasiadamente boa. Culpo-vos disto: vós nunca
haveis lido a vossa Bíblia. Alguns de vós nunca a haveis lido completamente, e
o vosso coração diz-vos que o que estou dizendo é verdade. Não sois leitores da
Bíblia. Afirmais que tendes uma Bíblia em vossas casas: acaso penso que sois
tão pagãos que não tendes uma Bíblia em casa? Mas, quando foi a última vez que
a haveis lido? Como sabeis que as lentes que haveis perdido há três anos atrás,
não estão na mesma gaveta com a Bíblia? Muitos de vós não tendes lido nem uma
só página desde há muito tempo, e Deus poderia dizer-vos: “[Eu] escrevi para eles as grandezas da minha lei; mas isso é para ele
como coisa estranha.” (Os
8:12, ARC, Pt) Há outros que lêem a Bíblia, porém quando a lêem, dizem que é
terrivelmente árida. Aquele jovem que está acolá diz que ela é um “frete”; essa
é a palavra que ele usa. Ele conta-nos: “A minha mãe disse-me: quando fores
para a cidade, lê um capítulo, em cada dia. E eu prometi para lhe agradar.
Oxalá o não tivesse feito. Não li qualquer capítulo, nem ontem, nem antes de
ontem. Estive muito ocupado. Não pode evitá-lo.” Tu não amas a Bíblia, não é
verdade? “Não, não encontro nela nada de interessante.” Ah! Isso é o que eu
também pensava. Mas, há pouco tempo atrás, também eu não podia ver nada nela.
Sabes porquê? Porque os cegos não podem ver, podem? Porém, quando o Espírito
tocou as escamas dos meus olhos, estas caíram, e quando Ele põe colírio nos
olhos, então a Bíblia torna-se preciosa.
Recordo
um ministro que foi um dia visitar uma senhora, já anciã, e se propôs a
levar-lhe o consolo de algumas das preciosas promessas da Palavra de Deus.
Buscando, encontrou na Bíblia da senhora, escrito na margem, um “P” e ele
perguntou: “Que significa isto? “Isto quer dizer precioso, senhor.” Um pouco
mais adiante descobriu um “P” e um “E”, escritos juntos, e voltou a perguntar o
seu significado, e ela respondeu-lhe: “isto quer dizer ‘provado e
experimentado’, porque eu já o provei e também já o experimentei.” Se vós já
tiverdes provado e experimentado a palavra de Deus, se ela é preciosa para as
vossas almas, então vós sois cristãos: porém, essas pessoas que desprezam a
Bíblia, “não têm parte nem sorte neste assunto.” (At 8:21) Se ela lhes parece
árida, vós estareis áridos no final, no Inferno. Se não a estimais como algo
melhor do que o vosso necessário alimento diário, não há nenhuma esperança para
vós, porque careceis da maior evidência do vosso Cristianismo.
Mas,
ai! Ai! O pior está por vir. Há pessoas que odeiam a Bíblia, e também a
desprezam. Acaso temos algumas dessas pessoas aqui? Alguns de vós tereis dito:
“Vamos e ouçamos o que o tem a dizer esse jovem pregador.” Pois bem, isto é o
ele tem para vos dizer: “Vede, ó desprezadores, e
espantai-vos e desaparecei” (At
13:41, ARC, Pt). Isto é o Ele tem para vos dizer: “Os
ímpios serão lançados no inferno, e todas as gentes que se esquecem de Deus” (Sl 9:17, ARC, Pt). E também tem de
dizer-vos isto: “Sabendo primeiro isto: que nos
últimos dias virão escarnecedores, andando segundo as suas próprias
concupiscências” (2Pe 3:3,
ARC, Pt). Porém, mais ainda, vos diz hoje que se quiserdes ser salvos, deveis
encontrar a salvação aqui. Portanto, não menosprezeis a Bíblia: esquadrinhai-a,
lede-a, vinde a ela. Oh zombador, certifica-te de que as tuas gargalhadas não
podem alterar a verdade, nem as tuas zombarias te podem livrar da inevitável
condenação. Ainda que na tua dureza fizesses um pacto com a morte e assinasses
um tratado com o Inferno, ainda assim, a veloz justiça te alcançará, e a
poderosa vingança te fulminará. Em vão zombas e ridicularizas, pois as verdades
eternas são mais poderosas do que todos os teus sofismas: os teus engenhosos
ditos não podem alterar a verdade divina de uma só palavra deste volume da
Revelação. Oh! Por que contendes com o teu melhor amigo e mal tratas o teu
único refúgio? Ainda há esperança para o zombador. Esperança nas veias do
Salvador. Esperança na misericórdia do Pai. Esperança na obra omnipotente do
Espírito Santo.
Terminarei
quando tiver dito só mais uma palavra. O meu amigo, o filósofo, diz que é muito
bom que eu exorte as pessoas a lerem a Bíblia: porém, ele pensa que há muitas
outras ciências grandiosas, mais interessantes e úteis do que a teologia. Muito
agradecido senhor, pela sua opinião. A que ciência se refere você? À ciência de
dissecar escaravelhos e colecionar mariposas? “Não, certamente não é a essa.” À
ciência de analisar as rochas, e de tomar mostras da terra e falar-nos dos seus
diferentes extratos? “Não, tampouco a essa precisamente.” “A que ciência,
então?” Ele responde-me: “Todas as ciências, em geral, são mais importantes do
que a Bíblia.” Ah! Senhor, essa é sua opinião, e fala dessa maneira porque está
longe de Deus. Pois a ciência de Jesus Cristo é a mais excelente das ciências.
Que ninguém deixe a Bíblia porque não é um livro culto e de sabedoria. Ela é-o.
Quereis saber de astronomia? Aqui está: Ela fala do Sol da Justiça e da Estrela
de Belém. Quereis saber de botânica? Aqui está: Ela fala-nos de algumas plantas
de renome: o Lírio dos Vales e a Rosa de Saron. Quereis saber de geologia e
mineralogia? Podeis aprendê-lo na Bíblia: podeis ler acerca da Rocha dos
Séculos e da Pedrinha Branca com um novo nome gravado, o qual ninguém conhece,
senão aquele que o recebe. Quereis estudar história? Aqui estão os anais mais
antigos do género humano. Qualquer que seja a ciência de que se trate, vinde e
buscai-a neste livro. Essa ciência está aqui. Vinde e bebei desta formosa fonte
de conhecimento e de sabedoria, e descobrireis que sereis feitos sábios para a
salvação. Sábios e ignorantes, crianças e homens, cavalheiros de cabelos
brancos, jovens e moças —a vós vos falo, vos peço e vos suplico: respeitai as
vossas Bíblias e esquadrinhai-as, porque nelas nós pensamos ter a vida eterna,
e são elas que dão testemunho de Cristo.
Terminei.
Voltemos para casa e ponhamos em prática tudo quanto ouvimos. Conheço uma
senhora que quando lhe foi perguntado sobre o que recordava do sermão do
pastor, disse: “Não recordo nada do mesmo. Era sobre pesos falsos e medidas
fraudulentas, e eu não me recordo de nada do que foi dito, exceto de que quando
cheguei a casa, tive de queimar as minhas medidas de grão.” Assim, se vós vos
recordardes, quando chegardes a vossas casas, de queimar as vossas medidas de
grão; se recordares, quando chegardes a vossas casas, de lerdes a Bíblia, eu
terei dito o suficiente. Queira Deus, na Sua infinita misericórdia, quando
lerdes as vossas Bíblias, de pôr as vossas almas sob os raios iluminadores do
Sol da Justiça, pela obra do sempre adorável Espírito; deste modo, tudo quanto
tiverdes lido vos será para o vosso proveito e para a vossa salvação.
Podemos
dizer da BÍBLIA:
“De
Deus és o escaparate do conselho revelado!
Onde
a felicidade e a aflição estão colocados de tal maneira
Que
todo homem sabe o que lhe corresponderá
Se
interpreta tudo correctamente.”
“És
o índice da eternidade.
Não
poderá deixar de receber a eterna felicidade
Quem
se guie por este mapa,
Nem
se pode equivocar quem fale por este livro.”
“É
o livro de Deus. Quero dizer
O
Deus dos livros, e peço que aquele que olhe
Irado
para esta expressão, como demasiado ousada,
Reprima
os seus pensamentos em silêncio, até encontrar outra igual a esta.”
[1] Liberdade de opinião, especialmente
em assuntos pertencentes às crenças religiosas.
Notas e Tradução de Carlos António da Rocha
Notas e Tradução de Carlos António da Rocha
****
Esta tradução é de
livre utilização, desde que a sua ortografia seja respeitada na íntegra porque
já está traduzida no Português do Novo Acordo Ortográfico e que não seja nunca
publicada nem utilizada para fins comerciais; seja utilizada exclusivamente
para uso e desfruto pessoal.
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