C. H. Spurgeon
Sermão n.º 405
“A entrada triunfal em Jerusalém” (The triumphal
entry into Jerusalem), pregado na manhã de domingo, 18 de agosto de 1861, por
C. H. Spurgeon no Metropolitan Tabernacle, Newington, Inglaterra.
“Dizei à
filha de Sião: Eis que o teu Rei aí te vem, manso, e assentado sobre uma
jumenta, e sobre um jumentinho, filho de animal de carga.” (Mt 21:5, ARC, Pt)
Nós
lemos o capítulo do qual provem o nosso versículo; agora, permiti-me repassar o
incidente na vossa presença. Existia uma expectativa na mente popular do povo
judeu, de que o Messias estava para vir. Eles esperavam que Ele fosse um
príncipe temporal; alguém que devia guerrear contra os Romanos e restaurar aos
Judeus a sua perdida nacionalidade. Havia muitos que, embora não cressem em
Cristo com uma fé espiritual, esperavam, entretanto, que talvez Ele pudesse ser
para eles um grande libertador temporal, e lemos que em uma ou duas ocasiões,
eles haviam querido tomá-Lo para fazê-Lo rei, mas Ele ocultou-Se-lhes. Havia um
ansioso desejo de que alguém, quem quer que fosse, deveria levantar o
estandarte da rebelião e liderar o povo contra os seus opressores.
Vendo
as obras portentosas feitas por Cristo, o desejo é pai do pensamento, eles
imaginaram que Ele podia, provavelmente, restaurar o Reino a Israel e torná-los
livres. O Salvador, à distância, via que estava chegando uma crise. Para Ele,
necessariamente, tinha de ser uma de duas opções: a morte por ter dececionado a
expectativa popular, ou, pelo contrário, devia ceder aos desejos do povo e ser
feito Rei. Vós sabeis qual foi a escolha.
Ele
veio para salvar outros, e não para ser ungido rei no sentido em que os judeus
o entendiam. O Senhor tinha operado o mais notável milagre, havia ressuscitado
Lázaro da morte depois dele ter estado enterrado quatro dias. Este era um
milagre tão singular e tão espantoso, que se tornou o assunto da conversa na
cidade. Multidões foram de Jerusalém a Betânia, que ficava situada a cerca de
duas milhas de distância, para ver Lázaro. O milagre fora bem autenticado, havia
uma multidão de testemunhas, e foi, em geral, aceite como sendo uma das grandes
maravilhas da época, e eles inferiram disto que Cristo tinha de ser o Messias.
O povo determinou que agora eles deveriam fazê-Lo rei, e que agora Ele deveria
liderá-los contra as hostes de Roma. Ele não pretendia tais coisas, todavia,
prevaleceu o entusiasmo deles, pelo qual Ele pôde ter a oportunidade de
realizar o que tinha sido escrito acerca dEle pelos profetas. Não deveis
imaginar que todos aqueles que juncaram de ramos o caminho e clamaram “hosana”
se interessavam por Cristo como príncipe espiritual.
Não,
eles pensavam que Ele ia ser um libertador temporal, e quando eles descobriram,
mais tarde, que estavam enganados, odiaram-nO na mesma proporção com que O
tinham amado, e “Crucifica-O, crucifica-O” era um clamor tão alto e veemente
quanto “Hosana, bendito o que vem em nome do Senhor.”
O
nosso Salvador, assim, utilizou-Se do desatinado entusiasmo deles para cumprir
diversos fins e propósitos sábios. Era necessário que esta profecia se
cumprisse —“Alegra-te muito, ó filha de Sião;
exulta, ó filha de Jerusalém: eis que o teu rei virá a ti, justo e Salvador,
pobre, e montado sobre um jumento, sobre um asninho, filho de jumenta.” (Zc 9:9, ARC, Pt) Era necessário, além
disso, que Ele reivindicasse publicamente ser o Filho de David, e que
reivindicasse ser o legítimo herdeiro do trono de David, —isso, Ele o fez nesta
ocasião.
Também
era necessário, que Ele deixasse os Seus inimigos sem desculpas. A fim de que
eles não Lhe dissessem: “Se tu és o Messias, dize-no-lo claramente.” Ele disse-lhes,
claramente, que o era. Este passeio pelas ruas de Jerusalém foi uma clara
manifestação e uma proclamação dos Seus direitos régios, tão claramente quanto
poderiam ser proclamados
Penso,
além disso —e sobre esta consideração quero construir o meu sermão desta manhã—
penso que Cristo usou o fanatismo popular como uma oportunidade de nos pregar
um vivo sermão, encarnando-lhe grandes verdades de que somos muito aptos a
olvidar o seu carácter espiritual, plasmando-as na forma e no símbolo
exteriores que O mostravam cavalgando como rei, escoltado pelas hostes dos
seguidores. O tema do nosso sermão será esse. Vejamos o que poderemos aprender
dele.
I.
Uma das primeiras coisas que aprendemos é esta: deste modo, através das ruas,
com solenidade, Jesus Cristo reivindicou que era rei. Esta reivindicação tinha
sido mantida, em grande medida, até agora, em segundo plano, porém, agora,
antes que Ele fosse para Seu Pai, quando a ira dos Seus inimigos tivesse
alcançado o ponto máximo da fúria, e antes que a Sua própria hora da mais
profunda humilhação acabasse de chegar, Ele fez uma aberta reivindicação diante
dos olhos de todos os homens, ser chamado e reconhecido como rei.
Ele
notifica primeiro os Seus arautos. Dois discípulos vêm. Ele dá-lhes as Suas
instruções —“Ide à aldeia que está diante de vós, e logo achareis presa uma
jumenta e com ela um jumentinho.” Ele reúne os Seus cortesãos. Os Seus doze
discípulos, aqueles que habitualmente O acompanhavam, estão à Sua volta. Ele
monta o jumento, que em tempos antigos tinha sido domado pelos legisladores
judeus, os governadores do povo. Ele começa o passeio através das ruas e as
multidões aplaudem. É calculado por alguns que não menos de três mil pessoas
deveriam ter estado presentes naquela ocasião, algumas indo adiante, outras
seguindo após Ele, e outras paradas, ao lado, para ver o espectáculo. Ele
cavalgava para a Sua capital: as ruas de Jerusalém, a cidade real, estão
abertas para Ele; como rei, Ele sobe para o Seu palácio.
Ele
era um rei espiritual, e portanto Ele não ia para o palácio temporal, mas para
o palácio espiritual. Ele cavalga para o templo, e, então, tomando posse dele,
começa a ensinar nele como ainda não O tinha feito anteriormente. Ele tinha estado
algumas vezes no pórtico de Salomão, mas Ele estava mais frequentemente na
encosta da montanha do que templo; mas agora, como rei, Ele toma posse do Seu
palácio, e aí, sentado no Seu trono profético, Ele ensina o povo na Sua corte
real.
Príncipes
da terra, dai ouvidos, há alguém que reclama ser contado convosco. É Jesus, o
Filho de David, o Rei dos Judeus. Dai-Lhe lugar, vós imperadores, dai-Lhe
lugar! Dai lugar ao Homem que nasceu numa manjedoura! Dai lugar ao Homem cujos
discípulos eram pescadores! Dai lugar ao Homem cuja túnica era a de um
camponês, inconsútil[1],
de só um tecido, de cima a baixo! Ele não leva qualquer coroa, exceto a coroa
de espinhos, contudo Ele é mais régio do que vós. Não cobre os Seus lombos com
púrpura, não obstante, Ele é muito mais imperial do que vós. Não calça
sandálias de prata adornadas com pérolas, mas Ele é mais glorioso do que vós.
Dai-Lhe lugar! Dai-Lhe lugar! Hosana! Hosana! Que Ele seja novamente proclamado
Rei! Rei! Rei! Que se considere o Seu lugar sobre o Seu trono muito por cima de
todos os reis da Terra. Isto é o que Ele fez então, proclamou-Se a Si mesmo
Rei.
II.
Além do mais, Cristo mostrou pelo Seu ato que tipo de rei Ele poderia ter sido
se Lhe tivesse agradado, e que tipo de rei Ele pode agora ser, se Ele o
desejasse. Se tivesse sido esta a vontade do nosso Senhor, aquelas multidões
que O seguiam pelas ruas tê-Lo-iam coroado realmente nesse lugar, e então,
dobrando os joelhos, tê-Lo-iam aceite como o ramo que brotou da raiz seca de
Jessé —Ele que tinha vindo— o governante, o Silo entre o povo de Deus.
Tivesse
Ele dito apenas uma palavra, e com Ele à cabeça, ter-se-iam precipitado para o
palácio de Pilatos, e tomando-o de surpresa, com apenas uns poucos de soldados
na região, Pilatos poderia ter sido logo feito Seu prisioneiro e ter sido
condenado à morte. Ante o indomável valor e da tremenda fúria de um exército
judeu, a Palestina teria podido ser rapidamente limpa de todas as legiões
romanas, e ter-se tornado novamente numa terra real.
Mais
ainda, nós afirmamos, com o Seu poder de realizar milagres, com a Sua força que
fez os soldados retroceder quando Ele disse: “Sou eu”, Ele podia ter limpo, não
somente aquela terra, mas todas as outras, Ele podia ter marchado de país em
país, e de reino em reino, até que toda a cidade real e todo o estado régio
tivessem cedido à Sua supremacia. Ele poderia ter feito com que aqueles que
habitam em ilhas no mar se prostrassem diante dEle, e que aqueles que habitam
no deserto poderiam ter sido obrigados a lamber o pó.
Não
há uma razão, ó reis da terra, pela qual Cristo não tivesse sido mais poderoso
do que vós. Se o Seu reino tivesse sido deste mundo, Ele teria podido fundar
uma dinastia mais duradoura do que as vossas, Ele teria podido reunir tropas,
diante de cujo poder, as vossas legiões se teriam derretido como a neve diante
do Sol de verão, Ele teria podido despedaçar a imagem de Roma, até que
convertida numa massa triturada, como um vaso de oleiro destruído por uma vara
de ferro, se teria esboroado.
Ainda
é assim, meus irmãos. Se essa for a vontade de Cristo. Ele poderia fazer de
Seus santos, de cada um deles, príncipes. Ele poderia fazer a Sua Igreja rica e
poderosa, Ele poderia levantar a Sua religião se Ele assim o escolhesse, e
convertê-la na mais magnificente e sumptuosa. Se esta é a Sua vontade, não há
razão para que toda a glória que nós lemos no Velho Testamento sob Salomão, não
possa ser concedida à Igreja sob o grande Filho de David.
Mas,
Ele não veio para fazer isto, e a partir desta altura, por isso, a impertinência,
daqueles que pensam que Cristo deve ser adorado com uma deslumbrante
arquitetura, com magníficos paramentos, com orgulhosas procissões, com a
aliança dos estados com as igrejas, fazendo dos bispos de Deus magníficos
senhores e governadores, com o alçar a própria igreja, e com o pretender
colocar sobre os seus ombros aquelas roupas que nunca lhe caberão, vestimentas
que nunca foram destinadas para ela. Se Cristo Se importasse com esta glória do
mundo, logo ela teria estado a Seus pés. Se Ele desejasse tomá-la, quem
levantaria uma palavra contra a Sua reivindicação, ou quem levantaria um dedo
contra o Seu poder! Mas Ele não Se preocupa com isso.
Leva
as tuas bugigangas para outro lugar, retira daqui o teu ouropel, pois Ele não
os quer. Remove a tua glória, e a tua pompa, e o teu esplendor, pois Ele não
necessita de nada disso das tuas mãos. O Seu reino não é deste mundo, pois,
pelo contrário, os Seus servos lutariam, pelo contrário, os Seus ministros
estariam vestidos com mantos de escarlate, e os Seus servos se sentariam no
meio dos príncipes, mas Ele não Se importa com isto.
Povo
de Deus, não procures estas coisas. O que o vosso Mestre não teria, não o
procurai para vós. Oh! Igreja de Cristo, tu tens também de desdenhar daquilo
que o teu Marido desdenhou! Ele teria podido tê-lo, mas Ele não o quis. E Ele
deu-nos a lição, de que se todas estas coisas pudessem ser da Igreja, porém,
foi bom, por Ele ter passado por elas e dizer: “Elas não são para mim —Eu não pretendo brilhar nestas plumas
emprestadas.”
III. Mas, em terceiro lugar, e aqui radica o âmago
do assunto, comento: vós tendes visto que
Cristo proclamou que era rei; vós tendes visto que tipo de rei Ele poderia ter
sido e não quis ser, mas, agora, vós vedes que tipo de rei Ele é, e que tipo de
rei Ele proclama ser. Em que consistia o Seu reino? Qual a sua natureza? Qual
era a Sua autoridade régia? Quais haveriam de ser os Seus súbditos? Quais
haveriam de ser as Suas leis? Qual haveria de ser o Seu governo? Agora, vós
percebereis, imediatamente, a partir da passagem tomada como um todo, que o
reino de Cristo é um reino muito estranho, é algo totalmente diferente de tudo
quanto jamais se tenha visto ou de qualquer coisa que haverá de ser vista no
futuro, com a exceção dele.
Ele
era um reino, em primeiro lugar, no qual os discípulos são os cortesãos. O
nosso bendito Senhor não tinha príncipes à espera, nem O Arauto Cavalheiro do
Bordão Negro[2],
nenhuma guarda real que o acompanhasse, quem ocupava o lugar daqueles grandes
oficiais? Pois bem, uns poucos de pobres e humildes pescadores, é que eram os
Seus discípulos. Aprende, então, que se tu queres ser um par no reino de
Cristo, deves ser um discípulo; que estejas sentado aos Seus pés é a honra que
Ele te concederá. Ouvir as Suas palavras, obedecer aos Seus mandamentos,
receber a Sua graça —esta é a verdadeira dignidade, esta é a verdadeira
magnificência.
O
homem mais pobre que ame a Cristo, ou a mulher mais humilde que esteja disposta
a aceitá-Lo como seu mestre, converte-se imediatamente num membro da nobreza
que acompanha a Cristo Jesus. Que estranho reino é este, que converte
pescadores em nobres, e aos camponeses em príncipes, enquanto que eles ainda
continuam sendo pescadores e camponeses! Este é o reino do qual nós falamos, no
qual o discipulado é o mais alto grau, no qual o serviço divino é a cédula da
nobreza.
Este
era um reino, e estranho é dizê-lo, no qual as leis do rei, não estão, nenhuma
delas, escritas em papel. As leis do rei não são proclamadas pela boca de um
arauto, mas escritas no coração. Não percebeis que na narrativa Cristo ordena
aos Seus servos que vão e tomem o Seu corcel real, tal qual ele estava, e esta
era a lei: “Soltai-o e deixai-o ir?” Mas, onde estava escrita a lei? Estava
escrita no coração daquele homem a quem pertenciam a jumenta e o jumentinho,
pois ele imediatamente disse: “Deixai-os ir” gostosamente e com grande alegria;
ele considerou ser uma grande honra contribuir para o esplendor real deste
grande Rei de paz.
Assim,
irmãos, no reino de Cristo não vereis qualquer enorme livro de leis, nem
advogados, nem procuradores, nem litigantes que tenham necessidade de
interpretar a lei. O livro da lei está aqui, no coração, o advogado está aqui,
na consciência, a lei já não está escrita sobre pergaminho, não está promulgada
e escrita sobre aço e aflição, como foram os decretos romanos, mas sobre as
tábuas de carne do coração. A vontade humana é submetida à obediência, o
coração humano é moldado à imagem de Cristo, o Seu desejo torna-se o desejo dos
Seus súbditos, a Sua glória o Seu principal objetivo, e a Sua lei o maior
deleite das suas almas. Estranho reino este, que não necessita de leis, salvo
aquelas que estão escritas no coração dos seus súbditos.
Estranho
ainda, como alguns pensarão dele, este era um reino no qual as riquezas
incertas não partilham o que quer que seja da sua glória. Lá cavalga o Rei, o
mais pobre de todo o estado, por que aquele Rei não tinha onde reclinar a
cabeça. Lá cavalga o Rei, o mais pobre de todos eles, sobre o asno pertencente
a outro homem e que Ele teve de pedir emprestado. Lá cavalga, o Rei! Alguém que
está para morrer brevemente; despido das Suas roupas para morrer nu e
enjeitado.
E
Ele ainda é o Rei do Seu reino, o Primeiro, o Príncipe, o Líder, o Coroado de
toda a geração, simplesmente porque Ele tinha o mínimo. Ele era quem tinha dado
mais aos outros e retido o mínimo para Si mesmo. Ele que era o menos egoísta e
o mais desinteressado, Ele que viveu o máximo para os outros, era o Rei deste
reino.
E
olhai para os cortesãos, olhai para os príncipes! Todos eles eram pobres
também; eles não tinham bandeiras para pendurar nas janelas, assim que
estendiam as suas pobres roupas sobre os valados ou as penduravam nas janelas
quando Ele passava. Não possuíam esplêndida púrpura para fazer um tapete para
os pés do Seu asno, então eles estendiam as suas próprias roupas desgastadas
pelo uso no caminho; estendiam no caminho ramas de palmeira que podiam alcançar
facilmente das árvores que bordeavam os lados da estrada, porque eles não
tinham dinheiro com o qual pudessem custear a despesa de uma superior
celebração triunfal. Por todos os lados prevalecia a pobreza. Não havia
lantejoulas de ouro, nem estandartes desfraldados, nem o soprar de trombetas de
prata, nem pompa, nem circunstância!
Era
o próprio triunfo da pobreza. A Pobreza entronizada sobre o trono na própria
besta da Pobreza, cavalgando ao longo das ruas. Estranho reino é este, irmãos!
Eu espero que o reconheçamos —um reino no qual aquele que é o chefe entre nós,
não é aquele que é o mais rico em ouro, mas aquele que é o mais rico em fé; um
reino que não depende de qualquer rendimento exceto do rendimento da divina
graça, um reino que é oferecido a cada homem que se sente sob a sua sombra com
deleite, seja rico ou pobre.
Que
estranho reino é este! Mas, irmãos, aqui está alguma coisa talvez ainda mais
maravilhosa, era um reino sem forças armadas. Oh, príncipe, onde estão os teus
soldados? Este é teu exército? São estes os milhares de pessoas que Te servem?
Onde estão as suas espadas? Eles levam ramos de palmeira. Onde estão os seus
equipamentos? Quase se hão despido para pavimentar o Teu caminho com as suas
roupas. Esta é a Tua hoste? Estes são os Teus batalhões? Oh que estranho reino,
sem um exército! O mais estranho Rei, que não usa espada, mas cavalga avante,
no meio deste povo vitorioso e para conquistar um estranho reino, no qual há a
palma sem a espada, a vitória sem a batalha. Sem sangue, sem lágrimas, sem
devastação, sem cidades queimadas, sem corpos mutilados! Rei de paz. Rei de
paz, este é Teu domínio! Sucede o mesmo no reino sobre o qual Cristo é rei
hoje, não há a força para ser usada. Se os reis da Terra dissessem para os
ministros de Cristo: “Vamos emprestar-vos os nossos soldados,” a nossa resposta
deveria ser: “Que poderemos fazer com eles? —como soldados eles são-nos inúteis
para nós”. Foi um dia de desgraça para a Igreja quando ela pediu emprestada o
exército daquele pagão ímpio, o imperador Constantino, pensando que a
engrandeceria.
Ela
não ganhou nada com isso exceto poluição, degradação e vergonha, e essa Igreja
que pede a ajuda do braço civil para a ajudar, essa Igreja que quer estabelecer
que os seus Sabbaths sejam obrigatórios para as pessoas pela força da lei, essa
Igreja que quer que os seus dogmas proclamados com o ressoar dos tambores, e
que quer fazer com que o punho ou a espada se convertam nas suas armas, não
conhece a que espírito pertence. Estas são armas carnais. Estão fora de
propósito num reino espiritual. Os Seus exércitos são pensamentos amorosos, as
Suas tropas são palavras amáveis. O poder pelo qual Ele governa o Seu povo não
é a mão forte e o braço estendido da polícia ou da soldadesca, porém é pelas
ações de amor e pelas palavras de superabundante bênção que Ele declara o Seu
soberano domínio.
Este
também era um estranho reino, meus irmãos, porque ele estava desprovido de
qualquer tipo de pompa. Se vós a chamais de pompa, que pompa singular era ela!
Quando os nossos reis são proclamados, três estranhos indivíduos chamados
arautos, como não se vê outros iguais em qualquer outra ocasião, vêm cavalgando
à frente, para proclamar o rei. Estranhas são as suas vestes, romântico o seu
traje, e com som de trombeta o rei é magnificamente proclamado. Depois, vem a
cerimónia da coroação e como a nação se emociona de ponta a ponta com êxtase
quando o novo rei está pronto para ser coroado! Que multidões enchem as ruas!
Algumas vezes, nos tempos antigos, as velhas fontes eram preparadas para que
fluíssem vinho, e quase não havia uma rua que não estivesse decorada com
tapetes bordados por toda a parte. Mas aqui vem o Rei dos reis, Príncipe dos
reis da Terra, não há qualquer brioso corcel, nem algum cavalo fazendo
cabriolas que mantenha à distância os filhos da pobreza; Ele está montado sobre
um asno, e enquanto cavalga para a frente fala gentilmente às crianças que
aclamam: “Hosana,” e abençoa as mães e os pais da mais humilde condição, que se
acumulam ao Seu redor.
Ele
é acessível; Ele não está separado deles; Ele não reclama ser seu superior, mas
seu servo; sendo tão pouco imponente como rei, Ele era o servo de todos eles.
Sem trombetas soando —Ele estava contente com a voz dos homens, sem qualquer
adorno sobre o Seu asno, mas só com as vestimentas dos Seus próprios
discípulos, sem nenhuma pompa, além da pompa que alguns corações amorosos muito
voluntariamente Lhe concediam. Assim prossegue a Sua cavalgata; o Seu o reino é
o reino da mansidão, o reino da humilhação. Irmãos, que nós pertençamos a esse
reino também; que nós sintamos nos nossos corações que Cristo tem entrado em
nós para derribar todo o pensamento altivo e orgulhoso, para que cada vale seja
alçado, e que cada cerro seja abatido, e a Terra inteira seja exaltada naquele
dia!
Escutai
em seguida, e esta talvez seja uma componente admirável do reino de Cristo —Ele
veio estabelecer um reino sem impostos. Onde estão os cobradores de impostos do
Rei? Vós repondeis que Ele não tinha qualquer cobrador de impostos; sim tinha,
mas que imposto era esse! Cada homem, despia-se das suas vestimentas
voluntariamente; Ele nunca lhes pediu isso; o Seu rendimento fluía livremente
das oferendas dadas voluntariamente pelo Seu povo. O primeiro tinha emprestado
a sua jumenta e o seu jumentinho, os outros tinham dado as suas roupas. Aqueles
que tinham poucas roupas para partilhar, cortaram os ramos das árvores, e por
uma vez, ali havia um fausto que não tinha custado nada a ninguém, ou melhor,
que para ele nada foi exigido de ninguém, senão que todas as coisas foram dadas
espontaneamente. Este é o reino de Cristo, —um reino que não se mantém do dízimo,
nem de impostos prediais paroquiais, nem de contribuições obrigatórias para o
clero na Páscoa, mas um reino que se sustenta com as oferendas voluntárias do
povo disposto, um reino que não exige nada a ninguém, senão que vem ao homem
com uma força mais poderosa do que a exigência, dizendo-lhe: “Tu não estás
debaixo da lei, mas sob a graça, tendo sido comprado por preço”, consagra-te tu
e tudo o que tens ao serviço do Rei dos Reis! Irmãos, achais-me um louco ou um
fanático por falar de um reino desta espécie? De facto, seria fanatismo se
afirmássemos que um simples homem poderia estabelecer um domínio assim. Mas
Cristo fê-lo, e neste dia há dezenas de milhares de homens neste mundo que Lhe
chamam Rei, e que sentem que Ele é mais seu Rei do que o governante da sua
terra natal; que Lhe prestam uma homenagem mais sincera do que aquela que
pudessem alguma vez render ao mais amado soberano, sentem que o Seu poder sobre
eles é tal que não Lhe desejam resistir —o poder do amor, que as suas oferendas
para Ele são tão extraordinariamente insignificantes, que por isso eles desejam
dar-se completamente a si mesmos de agora em diante, isto é tudo o que eles
podem fazer. Um reino maravilhoso e incomparável! É algo que não pode nunca ser
encontrado na Terra.
Antes
de abandonar este ponto, gostaria de comentar que este evidentemente era um
reino no qual todas as criaturas eram tomadas em consideração. Porque tinha
Cristo duas bestas? Havia uma jumenta
e um jumentinho, cria de animal de carga; Ele montou o jumentinho porque ele
nunca tinha sido montado antes. Há pouco tempo, examinei diversos comentadores
para ver o que eles dizem acerca disso, e um antigo comentador fez-me rir
—creio que ele também vos fará rir— ao expressar o facto de que Cristo ao
ordenar aos Seus discípulos que trouxessem o filhote com a mãe nos deveria
ensinar que os infantes devem ser batizados da mesma forma como os seus pais, o
que me pareceu ser um argumento eminentemente digno do batismo infantil.
Pensando
na matéria, de qualquer modo, considero que há uma razão melhor a aduzir,
—Cristo não tolerará qualquer dor no Seu reino, Ele não tolerará que nem sequer
uma jumenta sofra por Ele, e se o filhote fosse retirado à sua mãe, teria
estado a pobre mãe no estábulo em casa pensando no seu filhote, e teria estado
o filhote desejando regressar, como aquelas vacas que os filisteus usaram
quando eles devolveram a arca, e que foram mugindo enquanto seguiam o seu
caminho, porque os seus bezerros estavam em casa.
Maravilhoso
reino de Cristo, no qual até a própria besta animal terá a sua porção! “Porque
a criatura foi sujeita à vaidade do nosso pecado.” A besta animal sofreu porque
pecámos, e Cristo tem o propósito de que o Seu reino devolva à besta animal à
sua felicidade prístina. Quer fazer-nos homens misericordiosos, atenciosos
inclusivamente com as bestas. Eu creio que quando o Seu reino vier plenamente,
a natureza animal será restaurada à sua antiga felicidade. “O leão como o boi
comerá palha. E a criança de peito brincará na toca do áspide, e a criança desmamada
colocará a sua mão na toca do basilisco.” A vetusta tranquilidade do Éden, e a
familiaridade entre o homem e as criaturas inferiores, retornará novamente.
E
mesmo agora, onde quer que o Evangelho seja plenamente conhecido no coração do
homem, esse homem começa a reconhecer que não tem qualquer direito para matar
protervamente um pardal ou um verme, porque estão no domínio de Cristo, e
Aquele que não quis montar um jumentinho sem que tivesse a sua mãe ao seu lado,
para que pudesse estar tranquilo e feliz, não quererá que algum dos Seus
discípulos pense com ligeireza ainda que seja das criatura mais insignificantes
que a Sua mão tenha feito. Bendito reino este que considera até mesmo as bestas
feras! Se Deus se preocupa com as reses? Ai, na verdade que O faz, e pela
própria jumenta, essa herdeira do trabalho pesado, Ele também cuida. O reino de
Cristo, então, preocupar-se-á tanto pelas bestas como pelos homens.
Mais
uma vez: Cristo ao cavalgar através das ruas de Jerusalém, ensinou de uma
maneira pública que o Seu reino haverá de ser um reino de alegria. Irmãos,
quando os grandes conquistadores cavalgam através das ruas, frequentemente
ouvem a alegria do povo; como as mulheres atiram rosas para o caminho; como se
amontoam em volta do herói do dia, e ondeiam os seus lenços para mostrar a sua
apreciação pela libertação alcançada.
A
cidade foi longamente sitiada, o paladino afugentou os sitiadores, e o povo
terá descanso agora. Abri de parar em par as portas; limpai as estradas e
deixai vir o herói; que o pajem mais insignificante que esteja no seu séquito
seja honrado neste dia por causa do libertador. Ah! Irmãos, mas nesses triunfos
quantas lágrimas há que estão ocultadas!
Há
uma mulher que ouve o repique dos sinos da vitória, e diz: “Ah! Vitória sem
dúvida, mas eu sou uma viúva, e os meus pequeninos estão órfãos!” E desde os
balcões de onde se assoma e sorri a beleza, poderá haver um esquecimento
momentâneo de amigos e parentes sobre os quais em breve terão de chorar, porque
cada batalha é com sangue, e cada conquista é com dor, e cada grito de vitória
contem pranto, lamentação e ranger de dentes. Cada som de trombeta pela batalha
ganha, não faz senão cobrir os gritos, as aflições, e as profundas agonias
daqueles que se hão visto separados da sua parentela!
Mas
no triunfo de Jesus, não houve lágrimas! Quando as crianças gritavam: “Hosana”
elas não tinham perdido os seus pais na batalha. Quando os homens e as mulheres
clamavam: “Bendito o que vem em nome do Senhor!” não tinha nenhum motivo para
gritar com a respiração entrecortada, ou para estragar a sua alegria com a
lembrança da desgraça. Não, no Seu reino há um gozo puro e sem mescla. Gritai,
gritai, vós que sois súbditos do Rei Jesus! Podereis ter aflições, mas não
provenientes dEle; podereis enfrentar-vos com problemas porque estais no mundo,
mas elas não vêm dEle. O Seu serviço é perfeita liberdade. Os Seus caminhos são
caminhos deleitosos, e todas as Suas veredas são de paz.
“Alegre-se o mundo, o
Salvador chega.
O Salvador há muito
prometido;
Prepare cada coração uma
melodia
E cada voz uma canção.”
Ele
vem para limpar as vossas lágrimas e não para provocá-las; Ele vem para
levantar-vos do lamaçal e colocar-vos sobre o Seu trono, para tirar-vos das
vossas masmorras e para vos permitir que salteis em liberdade.
“As bênçãos abundam onde
Ele reina.
O prisioneiro salta e é
libertado das suas cadeias:
O cansado encontra eternal
descanso.
E todos os filhos da
necessidade são abençoados.”
Singular
reino este!
IV.
E agora chego ao meu quarto e último tópico. O Salvador, na Sua entrada
triunfal na capital dos Seus pais declarou-nos muito claramente os efeitos
práticos do Seu reino. Ora, quais são eles? Um dos primeiros efeitos foi que a
cidade inteira se comoveu. O que significa isto? Significa que toda a gente
tinha alguma coisa a dizer sobre isto, e que cada pessoa sentiu alguma coisa
porque Cristo cavalgou através das ruas.
Havia
alguns que se inclinavam do topo das suas casas, e olhavam a rua e diziam uns
para os outros — “Ah! já viram brincadeira mais tola do que esta? Humpf! Lá vai
Jesus de Nazaré, lá em baixo, montando um asno! Certamente se Ele pretendia ser
rei podia ter escolhido um cavalo. Olha para Ele! Chamam a isto pompa! Lá está
um velho pescador que acaba de estender no solo a sua roupa fedorenta; atrevo-me
a dizer que nessas roupas havia peixes há uma ou duas horas atrás? “Olha,” diz
um, “vê aquele velho mendigo lançando gozoso o seu gorro para o ar! “Aha!”
dizem eles, “Houve alguma vez algo tão ridículo como isto?”
Eu
não posso expressá-lo nos mesmos termos como eles o teriam descrito: se o
pudesse, creio que o faria. Eu gostaria de fazer-vos ver quão ridículo isto
deve ter parecido ao povo. Porque, se o próprio Pilatos tivesse ouvido sobre
isso, teria dito —“Ah! Não há muito a temer disto. Não há nenhum temor que esse
homem derrube César alguma vez; não há temor de que alguma vez derrote um
exército. Onde estão as suas espadas? Não há uma só espada entre eles! Não dão
gritos que soem a rebelião; os seus cantos são somente alguns versos religiosos
tomados dos Salmos.” “Oh!” diz ele, “Todo este assunto é desprezível e
ridículo.”
E
esta era a opinião de muitíssimas pessoas em Jerusalém. Talvez esta seja a tua
opinião, meu amigo. O reino de Cristo, dizes tu, é ridículo; talvez não creias
que haja alguém que seja governado por Ele ainda que nós digamos que nós O
temos como nosso Rei, e que sentimos que a lei do amor é uma lei que nos
constrange a doce obediência. “Oh” dizes, “isto é fingimento e hipocrisia.” E
há alguns que assistem em lugares que contam com incensórios de ouro, e
altares, e sacerdotes e dizem: “Oh! Uma religião que é tão simples —cantando
uns poucos de hinos, e oferecendo uma improvisada oração! — Ah! Dêem-me um
bispo com uma mitra —um bom tipo metido numa casula— que isso é o que necessito.”
“Oh!,” diz outro, “quero ouvir o ressoar de um órgão; necessito ver que a coisa
se faça cientificamente, quero ver umas quantas vestimentas sagradas também;
que surja o homem coberto em roupas apropriadas para mostrar que ele é algo
diferente do resto do povo; não há-de estar vestido como se fosse um homem
ordinário; tenho de ver na adoração algo de diferente de todas as coisas que eu
já tivesse visto antes.”
Querem
que o assunto seja enroupado com alguma pompa, e porque não é assim eles dizem
— “Ah! Humpf!” Ridicularizam-nO, e isto é tudo o que Cristo recebe das
multidões de homens que se acham excessivamente sábios. Ele é para eles loucura
e eles passam por Ele de largo, com desprezo. Os vossos escárnios tornar-se-ão
em breve lágrimas, senhores! Quando Ele vier com pompa e esplendor régios, vós
chorareis e lamentar-vos-eis, porque repudiastes o Rei da Paz.
“O Senhor virá! De uma
forma terrível,
Com grinalda de arco-íris e
manto de tempestade,
Com voz de querubim e asas
de vento,
O Juiz designado de toda a
humanidade.”
Então
descobrireis que foi algo perturbador tê-Lo tratado com desprezo. Sem dúvida,
havia outros em Jerusalém, que estavam cheios de curiosidade. Diziam —“Meu
Deus, o que pode ser isto? O que significa isto? O que é isto? Quem é este
indivíduo? Gostaria que viesses,” diziam ao seu vizinho, “e nos contasses a
história deste homem singular, gostaríamos de conhecê-la.” Alguns deles
comentavam: “Ele foi para o templo, atrever-me-ia a dizer que Ele fará um
milagre,” assim que saíam correndo, e entre apertões, e cotoveladas, amontoavam-se
para presenciar o milagre. Eram como Herodes, pois desejavam ver algum portento
operado por Ele. Este era também o primeiro dia da chegada de Cristo, e, é
claro o entusiasmo podia durar uns nove dias se Ele prosseguisse, e assim
sentiam muita curiosidade sobre isso.
E
isso é tudo o que Cristo obtém de milhares de pessoas. Ouvem sobre um
reavivamento da religião. Bem, gostariam eles de saber do que se trata, e de se
inteirar a esse respeito. Há alguma coisa acontecendo em tal e tal local de
adoração; bem, eles gostariam de lá ir mesmo que fosse somente para ver o
lugar. “Há um estranho ministro dizendo coisas esquisitas, vamos ouvi-lo. Nós
tínhamos planeada uma excursão” —vós próprios sabeis a quem me estou referindo—
“nós tínhamos a intenção de fazer uma excursão hoje.” Dizes tu, “Porém, ao
invés disto, vamos até lá.”
Realmente
trata-se disto: pura curiosidade, pura curiosidade; isto é tudo o que Cristo
recebe hoje, e Ele que morreu na Cruz converte-se num tema de uma história vã,
e Aquele que é Senhor dos anjos e adorado pelos homens, é tema de conversação
como se fosse um Mago do Norte ou se trata-se de algum impostor excêntrico! Ah!
Daqui a pouco, reconhecereis ser perturbador tê-Lo tratado assim; porque quando
Ele vier, e quando todo o olho O ver, vós que perguntastes acerca dEle por
simples curiosidade, descobrireis que Ele se informará sobre vós, não com animosidade,
mas com ira, e dirá —“Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno.”
Mas,
no meio da multidão havia algumas pessoas que ainda foram piores, porque
presenciavam o assunto todo com inveja. “Ah!” disse o Rabi Simeão para o Rabi
Hillel. “O povo nunca se comprazeu tanto connosco. Nós sabemos muito mais do
que esse impostor; nós havemos lido a fundo todos os nossos textos religiosos.”
“Não te recordas dEle,” disse alguém, “que quando Ele era menino, era bastante
precoce? Lembras-te quando Ele veio ao templo e conversou connosco, e já desde
então Ele enganava o povo” querendo dizer com isso que Ele os havia eclipsado;
que Ele era mais estimado nos corações da multidão do que eles o eram, embora
eles fossem altamente orgulhosos.
“Oh!”
disse o fariseu, “ele não usa nenhumas filactérias, e eu fiz as minhas bem
grandes; eu fiz as minhas roupas quase todas com bordas, para que elas pudessem
ser superiores.” “Ah!” diz outro. “Eu dizimo a minha menta, o meu anis e o meu
cominho, e fico no canto das ruas e toco a trombeta quando dou um centavo, e,
ainda assim, o povo não me põe sobre um jumento; não me aplaudem nem me saúdam
com um ‘Hosana’; mas a terra inteira vai atrás deste homem como um bando de
crianças. Além disso, pensa entrar no templo para perturbar os que são melhores
do Ele, perturbando-nos a nós que fazemos uma exibição das nossas pretensas orações,
de pé no pátio!”
E
isto é o que Cristo obtém de um grande quantidade de pessoas. Eles não gostam
de ver a causa de Cristo progredir. Pelo contrário, gostariam que Cristo fosse
rebaixado para que eles se pudessem engordar com o despojo, quereriam que a Sua
igreja fosse desprezível. Encanta-os inteirarem-se das quedas de ministros
cristãos. Se eles pudessem achar alguma falha num cristão, “reportai-a,
reportai-a, reportai-a,” dizem eles. Mas se um homem anda honestamente, se
glorifica a Cristo, se a Igreja cresce, se almas são salvas, imediatamente há
tumulto e toda a cidade se movimenta; uma completa algazarra começa e é
conduzida com falsidade, fazendo acusações, e calúnias contra o caráter do povo
de Cristo. De um modo ou de outro, os homens serão indefetivelmente movidos; se
não são movidos ao escárnio, se não são movidos a investigar, então, são
movidos à inveja. Mas foi uma bênção que algumas pessoas de Jerusalém tivessem
sido movidas a regozijar-se.
Oh!
Houve muitos que como Simeão e Ana se regozijaram por ver aquele dia, e muitos
deles foram para casa e disseram: “Agora, Senhor, podes despedir em paz o Teu
servo, porque os meus olhos viram a Tua salvação.” Houve muitas mulheres que
descansavam nos seus leitos enfermas, nos becos afastados do centro de
Jerusalém, que se sentaram nas suas camas, dizendo: “Hosana!”, e desejaram
descer para a rua para estender os seus velhos mantos no caminho, e inclinar-se
diante dAquele que era o Rei dos Judeus. Havia muitos olhos lacrimejantes que
secaram as suas lágrimas naquele dia, e muitos crentes atribulados que
começaram naquela hora a regozijar-se com indescritível alegria. E assim, há
alguns de vós que ouvis de Cristo o Rei com alegria. Uni-vos ao canto do hino,
não como todos nós fazemos, unindo-nos com as nossas vozes, mas com o corarão.
“Regozijai-vos, o Salvador
reina,
O Deus de paz e amor
Quando Ele purificou as
nossas manchas.
Tomou o Seu assento nas
alturas
Regozijai-vos, Regozijai-vos!
Regozijai-vos em alta voz,
vós santos, Regozijai-vos!”
Este
é, então, o primeiro efeito do reino de Cristo! Seja onde for que Ele chegue, a
cidade é agitada. Não creiam que o Evangelho está realmente sendo pregado se
não causa uma comoção. Não creiam, meus irmãos, que o evangelho está sendo
pregado à maneira de Cristo, se não irrita a uns e alegra a outros; se não faz
muitos inimigos e alguns amigos.
Há
ainda outro efeito prático do reino de Cristo. Ele subiu ao templo e lá, junto
a uma mesa, estavam sentados um grupo homens com cestas que continham pares de
pombas. “Quer pombas, senhor, quer pombas?” Ele olhou-os e disse: “Tirai essas
coisas daqui.” Ele falou com santo furor. Havia outros que trocavam o dinheiro
conforme o povo entrava para pagar o seu meio siclo. Ele derrubou as mesas e
fez com que todos se retirassem, e logo esvaziou completamente o átrio de todos
estes mercadores que obtinham lucro da piedade, e que fazem da religião um
pretexto para o seu próprio emolumento.
Agora,
isto é o que Cristo faz onde que Ele chega. Eu quereria que Ele viesse com mais
frequência à Igreja de Inglaterra, e a purgasse da venda de nomeações, a
despojasse dessa maldita simonia que é ainda tolerada pela lei e a purgasse dos
homens que são malversadores, que tomam o que pertence aos ministros de Cristo,
e o aplicam para seu próprio uso. Eu quereria que Ele viesse a todos os nossos
lugares de adoração, para que de uma vez por todas pudesse ser visto que
aqueles que servem a Deus, O servem porque O amam, e não pelo que possam obter
com isso. Eu gostaria que cada pessoa que professa a religião pudesse estar
muito limpa na sua própria consciência, de que nunca fez uma profissão para
alcançar respeitabilidade ou alcançar a estima, mas apenas que o fez somente
para honrar a Cristo e glorificar o seu Senhor.
O
significado espiritual disso tudo é este —Nós não temos casas de Deus agora:
tijolos e argamassa não são santos, os lugares onde nós adoramos a Deus são
lugares de adoração, mas não são a casa de Deus depois que havemos saído deles.
Não cremos na superstição que torna um lugar qualquer sagrado, mas que nós
somos o templo de Deus. Os próprios homens são os templos de Deus, e onde
Cristo chega expulsa os compradores e os vendedores, e expurga todo o egoísmo.
Eu nunca crerei que Cristo, o Rei, haja convertido o teu coração no Seu palácio,
a menos que sejas abnegado. Oh, quantos professantes há que querem obter tanta
honra, tanto respeito! Quanto a dar aos pobres, e pensar que é mais bem-aventurado
dar do que receber; quanto a alimentar o faminto e a vestir o nu, quanto a
viver para os demais e não para si mesmos —não pensam em nada disso. Ó Senhor,
vem ao Teu templo e expele o nosso egoísmo! Vem agora, tira todas aquelas
coisas que propiciam servirmos a Mamom a servirmos a Deus; ajuda-nos a viver
para Ti, e a vivermos para os outros vivendo para Ti, e que não vivamos para
nós mesmos!
O
último efeito prático do reino de nosso Senhor Jesus Cristo foi que Ele teve
uma grande receção, teve-a, se me é permitido falar assim, um dia de
audiências; e quem foram as pessoas que estiveram presentes? Agora, vós
cortesãos, os discípulos, que hão vindo para ajudá-Lo, mostrai a vossa nobreza
e a vossa gentileza. Aqui vem um homem que tem uma ligadura por aqui, e o seu
outro olho quase cego — aze-o passar, aqui vem outro, os seus pés estão todos
torcidos e desfigurados— fazei-o passar, aqui vem outro coxeando sobre duas
muletas, ambas as pernas estão aleijadas; e outro indivíduo perdeu
completamente as pernas. Aqui vêem e aqui está a recepção. O próprio Rei vem
aqui e prepara uma grande reunião, e os cegos e os coxos são Seus convidados, e
agora Ele aproxima-Se, e toca a esse cego e a luz brilha; Ele fala a este homem
com a perna seca, e ele caminha; Ele toca dois olhos de uma vez e ambos vêem; e
a outro diz: “Vou tirar-te as tuas muletas, põe-te ereto e regozije-te e salta
com gozo.”
Isto
é o que Rei faz onde quer que Ele chega. Vem aqui esta manhã, suplico-Te,
grandioso Rei! Há olhos cegos aqui que não podem ver a Tua beleza. Caminha,
Jesus, caminha no meio desta multidão e toca os olhos. Ah! Então, irmãos, se Ele
fizesse isto, vós diríeis: “há uma beleza nEle que eu nunca vira
anteriormente.” Jesus, toca os seus olhos, pois eles não podem curar a sua
própria cegueira, mas cura-a Tu! Ajuda-os a olhar para Ti, pendurado na cruz!
Eles não podem fazê-lo a menos que Tu os habilites. Que o façam agora, e
encontrem vida em Ti! Ó Jesus, há alguns aqui que estão coxos, há joelhos que
não podem dobrar-se; nunca hão orado; há alguns aqui cujos pés não querem
correr no caminho dos Teus mandamentos —pés que não querem levá-los aonde o Teu
nome é louvado, e onde és tido em honra. Caminha, grandioso Rei, caminha em
solene pompa por toda esta casa, e fá-la semelhante ao templo da antiguidade!
Aplica aqui o Teu poder e mantêm a Tua grandiosa reunião curando os coxos e sarando
os cegos “Oh!” disse um, “eu queria que Ele abrisse os meus olhos.” Alma, Ele o
fará. Sussurra a tua oração agora, e assim o farás, porque Ele está junto de ti
agora. Está parado ao teu lado, Ele fala-te e diz-te —”Olha para Mim e sê
salvo, tu que és o mais vil dos vis.”
Há
outro que diz “Senhor: eu quero ser curado.” Ele responde —“Então sê curado.”
Crê nEle e Ele salvar-te-á. Ele está próximo de ti, irmão. Ele não está no
púlpito mais do que está no banco, nem num banco mais do que noutro. Não digas
—”Quem irá ao Céu para O encontrar, ou às profundezas para trazê-Lo?” Ele está
perto de ti; Ele escutará a tua oração mesmo que tu não fales; Ele escutará o
teu coração quando fales. Oh! Diz-Lhe —“Jesus, cura-me” e Ele o fará: Ele o
fará agora. Sussurremos uma oração, e logo nos iremos.
Jesus,
cura-nos! Salva-nos Filho de David, salva-nos! Tu vês quão cegos nós estamos —Oh!
Concede-nos a visão da fé! Tu vês quão coxos nós estamos —Oh! Dá-nos a força da
graça! E agora, agora mesmo, Tu, Filho de David, purifica o nosso egoísmo, e
vem e vem e reina em nós como nos Teus templos e palácios! Nós Te pedimos isto,
ó tu grandioso Rei, por Teu nome. Ámen.” E antes de abandonarmos este lugar,
clamemos novamente: “Hosana, hosana, hosana. Bendito o que vem em nome do Senhor.”
[1] Inconsútil: sem costura. Utiliza-se
usualmente falando da túnica de Jesus Cristo.
[2] O Arauto Cavalheiro do Bordão
Negro, em geral, abreviado para apenas Black Rod, é um funcionário nos
parlamentos de vários países da Comunidade das Nações.
Notas e Tradução de Carlos
António da Rocha
****
Esta tradução é de
livre utilização, desde que a sua ortografia seja respeitada na íntegra porque
já está traduzida no Português do Novo Acordo Ortográfico e que não seja nunca
publicada nem utilizada para fins comerciais; seja utilizada exclusivamente
para uso e desfruto pessoal.
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