Leituras Cristãs
Ivan Moiseyev,
de quepe (maio de 1972, dois meses antes de morrer).
25 GRAUS NEGATIVOS
Gidenko sentiu-se profundamente irritado pela
tranquilidade com que Moiseyev pareceu acatar a ordem. Esperara uma hesitação
da sua parte, uma tentativa de reconsideração, mas as feições dele estavam
perfeitamente calmas e os ombros, eretos, quando ele se encaminhou com passos firmes para a porta.
— Camarada soldado!
Ivan voltou-se. O major notou que ele estava
ligeiramente pálido. Portanto, ele tinha compreendido bem a determinação.
— As instruções dadas serão executadas em farda de
verão. Pode ir.
O primeiro contato com o ar frio foi como um tapa
no rosto que lhe provocou dor de cabeça e fez os olhos lacrimejarem. Ele
retraiu-se instintivamente para fugir do vento gelado que lhe ardia nas
orelhas. Sabia muito bem que as janelas dos alojamentos às escuras estariam
cheias de cabeças que o espiavam. A luz da Lua iluminava a ruela e os bancos de
neve contra a silhueta dos prédios. Entesou os músculos, como que tentando
resistir às lufadas geladas. Olhou o relógio. Passava um minuto das dez.
Teria tempo de sobra para orar. Começou
hesitantemente, sentindo nascer em seu coração um leve temor que logo procurou
afastar. Quanto tempo poderia suportar? E se ele sentisse tanto frio que
acabasse cedendo? E se morresse congelado? Será que o deixariam ali até morrer?
Tentou concentrar-se na oração, mas o pânico comprimia o seu peito. Quanto
tempo levaria para morrer congelado? Seria uma morte rápida? E se de manhã ele
estivesse quase congelado e eles o reavivassem? Ouvira dizer que a dor causada
pelo congelamento dos membros era terrível. E se tivessem de amputá-los? Tinha
de desviar o pensamento dessas coisas. Começou a cantar: "A alegria do
Senhor é a nossa força. A alegria do Senhor é a nossa força".
De repente, a gloriosa visão que tivera pela manhã
voltou-lhe à lembrança. Olhou para o largo, distante dali, mas perfeitamente
visível ao luar. Parecia-lhe que a luz angelical permanecia lá.
"Não tema. Vai. Eu vou com você", dissera
o anjo.
Ele se referia ao que aconteceria à noite. Sentiu
novamente o mesmo calor que experimentara naquele momento. Abriu os lábios e começou
a orar baixinho mas fervorosamente.
Era meia-noite e meia.
— Muito bem, Moiseyev, já reconsiderou a sua
posição? Quer entrar? Cansou-se de ficar aqui fora?
— Obrigado, camaradas oficiais. Eu gostaria muito
de entrar e ir dormir, mas não concordo em parar de falar a respeito de Deus.
— Quer dizer que vai ficar aqui a noite toda? — O
rosto deles exibia uma expressão de medo.
— Preferia não ficar. Mas não vejo como isto seria
possível, de outro modo. Além disso, Deus está me ajudando.
De pé, em posição de sentido, Ivan esfregava as
mãos com as pontas dos dedos. Sua voz tremia pela emoção. As mãos estavam
frias, mas não mais frias do que quando se trocara no alojamento. Tentou
exercitar também os dedos dos pés. Moveram-se facilmente, sem nenhuma dificuldade.
Foi então que um grande espanto começou a nascer dentro dele. Olhou para os
oficiais com grande comoção interior — apesar dos capotes pesados, eles estavam
enregelados. Batiam os pés e as mãos, movendo-se constantemente, impacientes
para retornarem aos dormitórios aquecidos. Em uma hora ele mudará de ideia,
ouviu o oficial mais graduado murmurar enquanto se afastavam. Ivan não pôde
deixar de sorrir.
Às 3:00h da madrugada, começou a cochilar. As suas
confissões de arrependimento haviam se encerrado. A intercessão por todos os
crentes fora repetida várias vezes. Cantara os cânticos natalinos. Orara por
todos os oficiais que conhecia de vista ou de nome. Clamara a Deus em favor dos
soldados da sua companhia. Mas, gradualmente, o seu pensamento ia se esvaindo.
Lutou para continuar em oração, mas não conseguia.
De súbito, uma voz despertou-o. O oficial em
serviço falava-lhe com brandura.
— Está bem, Moiseyev. Pode entrar agora. — A luz
mortiça que provinha do alojamento bateu nas insígnias douradas do quepe. O tom
com que lhe falou era carregado de sentimento.
— Afinal, que tipo de pessoa é você?
— Senhor?
— Que tipo de gente é você, que parece não ser
afetada pelo frio?
— Ah, camarada; eu sou uma pessoa comum, mas orei a
Deus e Ele me aqueceu — respondeu-lhe Ivan suavemente.
Tocando o braço do soldado para que o seguisse, o
oficial virou-se, e caminhando lentamente, dirigiu-se ao alojamento.
— Fale-me sobre esse Deus — disse.
In
“Ivan - O soldado cristão que enfrentou o terror policial soviético”, Grant Myrna. Tradução de Myrian Talitha Lins, Editora Betânia, pp. 55-61.
http://aronmacedo.multiply.com/tag/ivan
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