J. Edwin Orr
Sondando o coração
O Espírito Santo é o Autor do avivamento, tanto no
sentido individual quanto no coletivo. É o ministério dEle que produz no
cristão a sensação de necessidade, que leva uma congregação ao arrependimento,
que conduz uma comunidade inteira à transformação. Ele convence o mundo do
pecado, da justiça e do juízo, porém muitos cristãos dependem somente da sua
consciência ao invés de buscarem uma consciência iluminada pela Palavra de Deus
e vivificada pelo Espírito do Senhor.
A obra do Espírito, portanto, é mostrar ao pecador
a extensão das suas falhas, apontar o padrão perfeito da justiça em Cristo e
adverti-lo do inevitável juízo divino. Ele executa um trabalho semelhante no
coração do cristão, convencendo-o de carnalidades e falhas, estimulando-o à
entrega completa, à apropriação da justiça de Cristo para a sua vida diária e
advertindo-o do Tribunal de Cristo, onde poderá receber um galardão ou sofrer
perda.
É ao Espírito Santo que o cristão precisa recorrer
se quiser que o seu coração sedento encontre avivamento. Tal bênção depende da
purificação, que por sua vez, depende da confissão; a confissão só é possível
quando há convicção e esta, por fim, só vem quando o próprio Espírito de Deus
sonda e vasculha o coração.
A oração mais eficaz para o cristão que tem fome
espiritual é uma petição eloquente encontrada nos Salmos de David: “Sonda-me, ó
Deus, e conhece o meu coração; prova-me e conhece os meus pensamentos. E vê se
há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno.” (Sl 139.23,24
ARC1995).
Nunca compreendi plenamente a profundidade dessa
petição até que a vi na tradução de um idioma escandinavo. Ali a palavra
“sonda” é traduzida por uma palavra que significa esquadrinhar ou vasculhar.
Não precisamos de muita imaginação para fazer um quadro mental comparando o
serviço meticuloso de vasculhar com uma sondagem superficial. Quem vasculha
vira tudo de pernas para o ar e traz à luz coisas que estavam escondidas ou
esquecidas.
Nos tempos de afastamento ou frieza espiritual, o
Espírito de Deus é apagado (1Ts 5.19), e a consciência é abafada. À medida que
a vida continua, a tendência natural de uma pessoa que teve a consciência
despertada pelo Espírito é esquecer os acontecimentos desagradáveis. Mas,
quando há uma renovação da convicção, o entulho da vida rotineira é afastado, e
o elemento ofensivo é trazido novamente à atenção. Para que não haja
superficialidade na confissão, Deus precisa de vasculhar o coração por
completo.
A petição é totalmente pessoal por natureza.
“Sonda-me!” É muito comum as pessoas mais espirituais terem mais consciência
das falhas berrantes dos companheiros menos espirituais do que das suas próprias.
Na última Páscoa, os discípulos não disseram: “Será
que é Pedro? Seria Tiago... ou talvez Judas?” Cada um perguntou: “Porventura
sou eu, Senhor?”. Há um tempo para todo o propósito debaixo do céu, e isso
inclui introspecção saudável. As nossas orações não serão ouvidas até que
deixemos de “guardar o pecado no coração” (Sl 66.18). Somente quando o coração
é sondado e vasculhado é que o pecado pode ser arrastado para fora e
exterminado pela luz.
É significativo que a petição é dirigida a Deus.
Nem pastor, nem psiquiatra, nem médico ou psicólogo, nem amigo ou inimigo, nem pessoa
estranha ou a própria mente poderá adequadamente esquadrinhar o coração em
busca do pecado. O pecado ofende o Deus Todo-poderoso, e somente Deus pode
trazer à luz toda a sua verdadeira ofensa.
Quando abrem a sua vida a um conselheiro, a maioria
das pessoas só revela aquilo que lhes interessa, pensando na preservação dos
sentimentos. Por mais perceptivo e sagaz que seja, um pastor ou um psiquiatra
bem treinado é limitado pelos seus preconceitos, circunstâncias ou formação.
Toda a informação oferecida para análise é limitada pelos sentimentos da pessoa
que está buscando conselho, e a avaliação humana aplicada à situação é limitada
pelas ideias do conselheiro. O homem consegue fazer uma análise inadequada e um
diagnóstico arriscado. Deus, por outro lado, não comete erros.
Quantas vezes tenho notado, ao aconselhar
ex-combatentes de guerra, a tendência deles ao contar-me só o suficiente para
induzir-me a concordar com eles, a desculpar o seu erro e apaziguar a
consciência. Nunca ouvi um soldado dizer: “Foi bem pior do que isto que lhe
estou falando”, ainda que esse geralmente seja o caso.
Para identificar o pecado, a auto-avaliação é ainda
pior do que o conselheiro. O homem é totalmente incapaz de vasculhar o próprio
coração. Ele sempre conseguirá racionalizar o seu pecado. Lembro-me de um velho
conhecido que parecia ser um mentiroso patológico. Mentia tão frequentemente e
repetia tanto cada uma das mentiras que até ele própria acreditava nelas. Não
se pode confiar em ninguém para examinar o próprio coração. O coração é
enganoso.
Nem só o coração precisa de ser examinado, mas os
pensamentos também. Deus vasculha tanto o coração quanto a mente. Ele prova os
pensamentos, porque assim como o homem pensa no coração, assim ele é. O
homicídio começa com ódio, o roubo com cobiça e o adultério com pensamentos
impuros. A imaginação, muitas vezes, é mais forte do que a vontade, e, quando
se dá corda na mente para ela, inevitavelmente o pensamento gera ação.
Quando o Espírito esquadrinha o coração e a mente, Ele
mostra ao cristão quanto se afastou do caminho. A confissão do pecado o
conduzirá de volta para o caminho da comunhão. Isso em si já é um início de
avivamento espiritual para o indivíduo.
Mas será que o Espírito esquadrinha o coração e a
mente sem precisar de íntima cooperação com a vontade do homem? De forma
alguma. O cristão precisa cooperar plenamente com o Espírito Santo nesse
processo.
Primeiro, ele precisa reconhecer a sua necessidade
e de admitir com humildade que a condição do seu coração não está de acordo com
a vontade de Deus.
Depois, ele deve orar e pedir especificamente que o
Espírito esquadrinhe o seu coração. Não só é necessário que continue em oração,
durante a qual o Espírito pode agir, trazendo-lhe convicção, mas ele deve
também dar diligente atenção à leitura da Palavra, especialmente nas passagens
que têm relação com a sua necessidade ou falha, porque o Espírito também poderá
usar esse meio para trazer convicção.
E, finalmente, ele precisa usar a chave para abrir
os arquivos da memória e tentar recordar os atos ou tendências que
descarrilharam a sua vida espiritual. Ele pode procurar também o conselho de um
amigo, porque às vezes o Espírito Santo coloca a Sua repreensão na boca de um
amigo fiel. Ele pode até reexaminar as coisas indelicadas e desagradáveis que
os seus inimigos e críticos disseram a seu respeito, porque pode haver verdade
nelas, ainda que tenham sido ditas sem amor.
Para que ninguém se desculpe apenas por não ter
consciência de pecados mais grosseiros, observe no final da oração uma outra
petição: “Vê se há em mim algum caminho mau.” Na versão NVI, está assim: “Vê se
em minha conduta algo te ofende”. Qualquer coisa que ofende ou entristece o
Espírito Santo de Deus é um obstáculo à Sua bênção e impede o avivamento.
“E guia-me
pelo caminho eterno.” Qual é o caminho eterno? Essencialmente é o Caminho – o
próprio Cristo. “Se dissermos que mantemos comunhão com ele, e andarmos nas
trevas, mentimos e não praticamos a verdade” (1Jo 1.6). Andar no caminho eterno
significa andar na luz. Significa andar na verdade. Cristo é o Caminho, a
Verdade e a Vida. Andar no Caminho e obedecer a toda Verdade é o segredo da
vida abundante.
De uma coisa o cristão pode estar certo: o Espírito
Santo nunca deixa um coração sedento sem resposta. A cirurgia dEle é feita com
toda perícia, a cura e a restauração com toda a ternura. As disciplinas de Deus
são a manifestação do Seu amor.
in
“My All, His All”, J. Edwin Orr. Editado por Richard Owen Roberts. Copyright
1989. Usado com permissão
James Edwin Orr (15 de janeiro de 1912 - 22 de
abril de 1987) foi um ministro batista, palestrante e escritor.
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