ARREPENDIMENTO NA CHINA
Relato
de
Jonathan Goforth
Relato
de
Jonathan Goforth
A comunidade cristã em Shinminfu fora terrivelmente perseguida durante a Rebelião Boxer de 1900, na China. Cinquenta e quatro pessoas foram martirizadas. Aquelas que sobreviveram prepararam uma lista com 250 nomes das pessoas que participaram, de alguma maneira, no massacre. A ideia era de que, um dia, elas conseguiriam vingar-se dos assassinos.
Estávamos no meio de um avivamento nessa mesma cidade,
alguns anos depois. No quarto dia das reuniões, à tarde, chegamos a um ponto
crítico. Tive a sensação de que era uma testemunha num cenário de julgamento.
Após três horas de reunião, dei a bênção para tentar despedir o povo.
Imediatamente, surgiram clamores de todas as partes da
congregação. “Por favor, tenha piedade de nós e permita que a reunião continue.
Não temos conseguido dormir há várias noites, e assim será esta noite também se
você não nos der uma chance de nos livrarmos de nossos pecados.”
Pedi a uma missionária que levasse as senhoras e as meninas
para a ala feminina da escola e ficasse lá com elas até as coisas se acalmarem.
Não vi nenhuma outra possibilidade de levar a reunião a um encerramento.
Enquanto as senhoras e as meninas saíam uma por uma,
um dos evangelistas veio para a frente e ajoelhou-se. Ele confessou vários
pecados, aparentemente de forma bem sincera, porém a carga que visivelmente
pesava sobre sua consciência não parecia ter sido aliviada em nada.
“Já que você confessou seus pecados”, disse eu para
ele, “Deus é fiel e justo para o perdoar de todos eles e para purificá-lo de
toda a injustiça. Vá em paz.”
“Mas não confessei o pior de todos”, exclamou ele em
lágrimas. “Eu não quero perdoar.”
“Então,
evidentemente Deus não o pode perdoar a si”, respondi-lhe
“É impossível, humanamente, que eu perdoe”, explicou ele
angustiado. “No tempo dos Boxers, um homem veio e assassinou o meu pai. Desde
então, senti que era minha obrigação vingar-me da sua morte. Há poucos dias que
um amigo me escreveu dizendo: ‘Onde está a tua lealdade de filho? O teu pai foi
assassinado, e tu continuas sem o vingar. Tu nem és digno de ser meu amigo.’ Assim,
eu não posso perdoar àquele homem. Preciso destruí-lo.”
“Receio dizer-lhe, então”, eu disse, “que a Palavra de
Deus é muito clara quando afirma que o Senhor tampouco tr perdoará a ti.”
Depois disso,
ele não respondeu mais nada, porém continuou ali de joelhos, chorando.
Em seguida, um garoto, aluno da escola, levantou-se e
disse: “Em 1900, os Boxers vieram à minha casa e mataram o meu pai. Durante
todos esses anos, sempre achei que não havia outro caminho a seguir, a não ser
vingar aquele mal depois que eu me tornasse homem. Agora, porém, nesses últimos
dias, o Espírito Santo me fez sentir tão incomodado que não consigo comer ou
dormir ou fazer outra coisa. Sei que Ele está instando comigo para perdoar aos
assassinos por amor de Jesus. Por favor, orem por mim.”
Um outro rapaz contou como o seu pai, a sua mãe e o seu
irmão mais velho também tinham sido mortos pelos Boxers. No total, nove garotos
foram à frente naquele dia para contar como pais, mães, irmãos e irmãs haviam
sido assassinados diante dos seus olhos, e como desde então eles haviam vivido
na esperança de que um dia conseguiriam vingar essas mortes. Mas todos
confessaram que estavam sentindo-se muito mal, profundamente incomodados e sem
paz, e pediram que orássemos por eles a fim de que tivessem graça para perdoar
àqueles que lhes haviam feito tanto mal.
Depois de que as senhoras e meninas saíram, a reunião
continuou por mais duas horas e meia. Houve uma corrente ininterrupta de
confissões até ao fim. E, durante todo esse tempo, o evangelista que não
conseguia perdoar estava ajoelhado ali na frente, chorando. No final da
reunião, ele finalmente colocou-se em pé e olhou para a congregação. O seu
rosto estava cansado e angustiado.
“Já tomei a minha decisão”, bradou ele. “Não vou
descansar enquanto não matar o homem que assassinou o meu pai.”
Achei que nunca mais o veria.
Porém, quando voltei para o auditório das reuniões, no
dia seguinte, lá estava ele perto da plataforma, com o rosto brilhando como a
luz da manhã. Ele pediu a minha permissão para dizer algumas palavras antes de
iniciar a pregação.
Virando-se para o grupo de alunos, ele disse: “Eu
queria convidar os garotos que confessaram ontem e pediram graça para perdoar
aos assassinos de seus pais e familiares para que viessem aqui à frente, por
favor.”
Os nove rapazes saíram dos seus lugares e ficaram
enfileirados à frente da congregação.
"Eu ouvi suas confissões ontem à noite, rapazes”,
começou o evangelista. “Ouvi vocês dizerem que estavam dispostos a perdoar
àqueles que mataram os vossos familiares. Depois me ouviram, a mim, um líder na
igreja, declarar que eu não poderia perdoar e que não descansaria enquanto não me
tivesse vingado do homem que matou meu pai.
"Quando cheguei a casa depois da reunião, pensei
em como o diabo tiraria proveito do meu exemplo para tentar vos ridicularizar na
posição que tomaram. As pessoas diriam que vocês são jovens demais para
conhecer a própria mente ou coração. Olhariam para mim como um homem
inteligente que certamente conhecia o seu próprio coração e diriam: ‘É claro
que ele não acredita naquela conversa tola sobre perdoar aos seus inimigos.’
"Portanto, a fim de que o diabo não tire proveito
para induzi-los a andar no caminho errado, eu comprei estes nove hinários que vos
vou dar de presente, na esperança de que, cada vez que os abrirem para louvar a
Deus com os hinos impressos nestas páginas, vocês se lembrem de como eu, um
evangelista, recebi a graça de Deus para perdoar ao assassino de meu pai.”
Logo em seguida, a lista contendo os nomes das pessoas
contra quem os cristãos haviam planeado vingar-se foi apresentada, na frente da
congregação, e foi rasgada em pedaços pequeninos, para serem jogados fora e
esquecidos para sempre.
Carlos António da
Rocha
DUAS PEQUENAS NOTAS
1) Este meu texto é
de livre utilização, desde que a sua ortografia seja respeitada na íntegra
porque já está escrito com o Português do Novo Acordo Ortogáfico e que não seja
nunca publicado nem utilizado para fins comerciais; seja utilizado
exclusivamente para uso e desfruto pessoal.
2) Quando este meu texto for publicado por alguém no todo ou em parte é necessário referir sempre:
2) Quando este meu texto for publicado por alguém no todo ou em parte é necessário referir sempre:
de
Carlos António da
Rocha
fazendo sempre a hiperligação para o meu
blogue.
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