por John Owen
Tradução da obra "Meditations on the Glory of
Crist" de John Owen, numa versão abreviada intitulada "The Glory of Crist".
CAPÍTULO 13
Outra diferença entre a
contemplação presente pela fé da Glória de Cristo e o que veremos no Céu
Quando estamos vendo algo de uma distância
longínqua, isso desaparece da nossa vista se alguma coisa se colocar no meio.
Assim é às vezes com a nossa fé. Temos muito pouca ou nenhuma visão do todo da
Glória de Cristo. Enquanto estamos nesta vida, o Senhor Jesus, na Sua soberana
sabedoria, esconde-Se em algumas ocasiões de nós. Job queixava-se de que não
podia ver a Deus nem à sua esquerda nem à sua direita (veja-se Job 23:8-9).
Isaías escreveu: “Verdadeiramente Tu és Deus que Te encobres...” (Is 45:15). O
salmista clamou: “Até quando, oh Jeová? Te Esconderás para sempre?” (Sl 89:46).
Amiúde, ao escutar a pregação da Palavra, a
visão da Glória de Cristo é escondida a alguns, enquanto que, ao mesmo tempo,
outros são iluminados e edificados (veja-se Jo 14:22). Agora vou procurar
responder a duas perguntas:
1. Por que é que em algumas ocasiões o Senhor Se
esconde e oculta a Sua Glória dos crentes? Há muitas razões, mas só mencionarei
uma. Ele fá-lo para nos impulsionar para O buscarmos com todo o nosso coração.
Frequentemente, a negligência e a preguiça fazem-nos descuidar a nossa meditação
nas coisas celestiais. Porém Cristo é paciente connosco. Ele sabe que aqueles
que viram algo da Sua Glória, embora não O tenham valorizado como deveriam, não
podem suportar muito tempo a Sua ausência. Ele diz: “Irei e voltarei para o Meu
lugar, até que se reconheçam culpados e busquem a Minha face; estando eles
angustiados, de madrugada Me buscarão” (Os 5:15). Então, deveríamos reagir como
a noiva que buscava o seu amado mas que ao princípio não podia encontrá-lo. Ela
disse: “Levantar-me-ei, agora... Buscarei aquele a quem ama
a minha alma.” E quando o encontrou disse: “logo o achei e não o
deixei.” (veja-se Ct 3: 1-5)
Frequentemente somos semelhantes ao homem
descrito pelo profeta ao rei Acab: “Enquanto o teu servo estava ocupado numa e
noutra coisa, o homem desapareceu.” (veja-se 1Rs 20:40) Cristo compromete-Se
connosco e não deveríamos deixá-Lo ir-Se embora. Mas, enquanto estamos ocupados
numa e noutra coisa, as nossas mentes enchem-se muito com as coisas terrestres,
e, então, Ele vai-Se e não O podemos encontrar.
2. Como podemos saber quando Cristo retira a Sua
presença de nós, a fim de que não possamos ver a Sua Glória? Estou-me dirigindo
só àqueles, cuja preocupação principal é manter o seu amor e a sua fé fortes
para com Cristo. O efeito da Sua presença é que nos faz procurar imitá-Lo e
amá-Lo mais. É só quando estamos conscientes de viver pela fé que temos este
grande desejo de viver como Cristo. Crescer na imagem de Cristo significa
crescer em graça, santidade e obediência. Quando nos parece que este
crescimento se deteve, sabemos que Cristo não está connosco. (Nota do tradutor:
O autor não se refere a que Cristo nos deixe realmente, mas, sim, a que o
crente perde a consciência da presença de Cristo. Tal como Se Ele ocultasse o
Seu rosto e escondesse o Seu sorriso de nós.)
Há aqueles cujas mentes naturais chegam a ser
muito afetadas por olhar às imagens e aos crucifixos. Mas o efeito que é
produzido por uma imagem é somente um efeito natural. Um Cristo imaginário não
terá um efeito espiritual sobre a mente destas pessoas. É só através do
conhecimento espiritual da Glória de Cristo pela fé que é dado pode a graça
fazer com que a alma esteja disposta a ser mudada na Sua semelhança. Se os
nossos corações se tornarem frios e indiferentes nos nossos deveres
espirituais, é certo que o Senhor nos ocultou o Seu rosto temporariamente. É
igualmente certo que quando estamos olhando para a Glória de Cristo no
Evangelho (continuando em pensamentos santos e na meditação), experimentaremos
a Sua presença e a Sua graça obrando em nós. Provemos isto e veremos que o
nosso amor para com Ele cresce. É pela atividade da nossa fé em Cristo que o
Espírito Santo renova as nossas almas pelo Seu poder transformador.
Vamos a Cristo ao princípio para termos vida.
Mas também vamos a Ele como crentes a fim de termos uma vida mais abundante
(veja-se Jo 10:10). Como Ele reprova aqueles que não vêm a Ele para que tenham
vida, assim poderia Ele justamente reprovar-nos a nós por não virmos a Ele mais
repetidas vezes a fim de que tenhamos uma vida mais abundante.
Há muitos que dizem ser crentes que vivem uma
vida descuidada sem nenhuma preocupação real pelas bênçãos espirituais. Eles
não conhecem o santo e espiritual refrigério que o Senhor traz para nós por
meio do Seu Espírito Consolador. Tais bênçãos incluem a paz espiritual, o
consolo animador, o gozo inefável e a segurança bendita da nossa salvação. Sem
alguma experiência destas coisas, o nosso Cristianismo carece de vida, de
coração e é inútil. Como podemos dizer que cremos nas promessas acerca das
Glórias eternas do Céu, se não cremos nas promessas de desfrutar destas bênçãos
espirituais aqui e agora?
Cristo diz a todos os que O amam: “Eu o amarei e
Me manifestarei a ele... E meu Pai o amará, e viremos a ele, e faremos morada com
ele.” (Jo 14:21-23) Quando Ele vem e Se manifesta a nós, sempre nos traz a paz,
o consolo, o gozo e a segurança. E temos comunhão com Ele por meio deste
refrigério espiritual (veja-se Ap 3:20). Se perguntarmos, como recebemos tais
bênçãos? A resposta é: Olhando para a Glória de Cristo por meio da fé (veja-se
1Pe 1:9-10). Meditemos sobre a Glória da natureza única de Cristo, meditemos na
Sua humilhação ao vir a este mundo, meditemos na Sua presente posição de
exaltação no Céu, meditemos no Seu amor e na Sua graça. Então os nossos
corações serão afetados em grande medida por uma consciência do Seu amor, o
qual é a fonte de todo o nosso consolo espiritual (veja-se Jo 4:14 e Rm 5:5).
Quando perdemos estas bênçãos, então sabemos que a presença de Cristo nos deixou
momentaneamente e já não podemos ver a Sua Glória.
O propósito do Senhor de esconder a Sua Glória
da nossa vista é animar-nos para usarmos a graça que Ele nos deu e
impulsionar-nos para O buscarmos com todo o nosso coração. Sentimo-nos sem vida
e sem gozo, sem uma consciência do Seu amor em nossos corações? Não há nenhuma
outra maneira para nos recuperarmos outra vez do que nos voltarmos de novo para
Cristo. Todos os nossos problemas espirituais surgem de nós mesmos, dos desejos
pecaminosos que ainda permanecem em nós (os quais frequentemente se incrementam
pelas tentações do diabo). Por meio da fé, devemos fixar as nossas mentes na
Glória de Cristo e isto nos trará novamente a vida, o gozo e o amor às nossas
almas.
Se estivermos satisfeitos com uma mera ideia da
Glória de Cristo, como um dado de informação obtido das Escrituras, então não
encontraremos nela nenhum poder transformador para as nossas vidas. Amemos a
Cristo com todo o nosso coração; enchamos as nossas mentes com pensamentos de
deleite nEle; exercitemos continuamente a nossa confiança nEle; e então a
virtude procederá dEle para purificar os nossos corações, para incrementar a
nossa santidade, para fortalecer as nossas graças e para nos encher em todas as
ocasiões com gozo inefável e glorioso (1Pe 1:8). É bom quando o amor do nosso
coração é vivificado ao mesmo tempo que o nosso entendimento é iluminado. O
simples conhecimento sem o amor conduz ao formalismo vazio. O amor puro sem o
conhecimento conduz à superstição.
Nos próprios crentes, aonde existe o amor para
com o mundo e as coisas desta vida, a fé é debilitada e a mente torna-se
instável na sua visão da Glória de Cristo. Mas todos aqueles que tem uma visão
espiritual da Glória de Cristo terão um grande amor por Ele e as suas mentes encher-se-ão
com pensamentos acerca dEle (veja Fl 3: 8-10; Cl 3: 1-2).
Onde quer que o Evangelho é pregado, Satanás
cega as mentes daqueles que não crêem, “para que não lhes resplandeça a luz do
Evangelho da Glória de Cristo...” (2Co 4:4) Mas na salvação dos escolhidos,
Deus vence a Satanás e resplandece nos seus corações “para iluminação do
conhecimento da Glória de Deus na face de Jesus Cristo” (2Co 4:6). Mas Satanás
não se dá por vencido antes usa toda a espécie de artimanhas para inquietar as
mentes dos crentes. Os seus dardos de fogo fazem surgir temores e dúvidas no
coração dos crentes para que não possam sentir o amor de Cristo. A outros
fá-los descuidados para que não se auto examinem e não possam ver se Cristo
está neles ou não (veja-se 2Co 13:5). Desta forma, muitos deixam de procurar
uma experiência do poder e da graça do Evangelho nas suas próprias almas e
assim nunca chegam a descobrir as Glórias de Cristo que poderiam ter conhecido.
Agora, consideraremos novamente a visão que
teremos da Glória de Cristo no Céu:
1. Primeiro, as capacidades das nossas almas
serão aperfeiçoadas. Seremos como “os espíritos dos justos feitos perfeitos”
(Hb 12:23). Seremos livrados de todas as limitações da carne. Seremos
transformados para chegarmos a ser perfeitos em pureza e santidade, como Deus. Os
nossos corpos glorificados serão capazes de desfrutar da Glória de Cristo para
sempre. O nosso entendimento será perfeito. Enquanto olhamos para Deus, todos
os afetos do nosso coração se fixarão inseparavelmente nEle. No nosso estado
presente, às vezes, vemo-nos forçados a desviar-nos da consideração dessas
realidades tal como agora desviamos os nossos olhos do resplendor do Sol. Mas
naquele estado perfeito, seremos capazes de olhar continuamente para a Glória
com eterno deleite. David diz: “Quanto a mim, verei o Teu rosto em justiça;
estarei satisfeito quando despertar a Tua semelhança” (Sl 17:15). Nunca nos
cansaremos de olhar para Cristo, O qual é somente Ele a imagem e a semelhança
de Deus. Aqui andamos por fé, mas lá nos será dado um poder eterno de visão com
o qual O veremos tal como Ele é, cara a cara, com um desfrute perfeito para
todo o sempre.
2. Estar no Inferno sob a ira de Deus é o maior
mal possível. Mas estar lá para sempre, numa miséria sem fim, deve ser um mal
muito mais para além daquilo que a nossa capacidade possa imaginar ou
descrever. Mas com a futura bem-aventurança da vida eterna, não haverá
limitação de tempo nem nenhuma interrupção deste desfrute. “...E assim
estaremos sempre com o Senhor.” (1Ts 4:17). Não haverá necessidade de nenhum
dos nossos meios presentes de adoração. O desfrute constante, imediato e
ininterrupto de Deus e do Cordeiro suprirá tudo o que necessitamos. “O seu
templo é o Senhor, Deus Todo-poderoso, e o Cordeiro. E a cidade não necessita
de Sol nem de Lua, para que nela resplandeçam, porque a Glória de Deus a tem
alumiado, e o Cordeiro é a sua lâmpada.” (Ap 21:22-23) No Céu, a presença
perpétua de Cristo com os seus santos resulta numa experiência
perpétua de luz e de Glória. Não haverá dúvidas nem temores porque estaremos
num estado de contínuo triunfo sobre eles (veja-se 1Co 15:55-57). A visão da
Glória de Cristo sempre será a mesma, mas sempre nova. Sem nada que distraia a
mente, teremos o desfrute mais perfeito de uma vida bendita centrada no objeto
mais perfeito, ou seja, a Glória de Cristo. Esta experiência é a maior
bem-aventurança da qual a nossa natureza humana é capaz de desfrutar.
Meditations on the Glory of Crist" de John
Owen numa versão abreviada intitulada "The Glory of Crist"
Tradução de Carlos António da Rocha
John
Owen (Stadhampton, 1616 - Ealing, 24 de agosto de 1683) é, por
consenso, o mais bem conceituado teólogo puritano, e muitos o
classificariam, ao lado de João Calvino e de Jonathan Edwards, como um
dos três maiores teólogos reformados de todos os tempos.
Nascido em 1616, entrou para o Queen's College, em Oxford, aos 12 anos de idade e completou seu mestrado em 1635 aos 19 anos de idade. Em 1637 tornou-se pastor.
Na década de 1640 foi capelão de Oliver Cromwell e, em 1651, veio a ser deão da Christ Church, a maior faculdade de Oxford. Em 1652, recebeu o cargo adicional de vice-reitor da universidade, a qual passou a reorganizar com sucesso notável.
Depois de 1660, foi líder dos Independentes (mais tarde chamados de congregacionais, até sua morte em 1683.
Nascido em 1616, entrou para o Queen's College, em Oxford, aos 12 anos de idade e completou seu mestrado em 1635 aos 19 anos de idade. Em 1637 tornou-se pastor.
Na década de 1640 foi capelão de Oliver Cromwell e, em 1651, veio a ser deão da Christ Church, a maior faculdade de Oxford. Em 1652, recebeu o cargo adicional de vice-reitor da universidade, a qual passou a reorganizar com sucesso notável.
Depois de 1660, foi líder dos Independentes (mais tarde chamados de congregacionais, até sua morte em 1683.
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